4.11.17

CTT

Era uma encomenda barata, feita num site chinês da especialidade, mas recebi-a com defeito de fabrico. Reclamei e, dois dias depois, tinha um estafeta à porta a levantar a peça inquinada e a entregar-me uma de substituição. 

A história é conhecida de todos e ilustra a forma como o comércio eletrónico está a cercar por todos os lados o comércio tradicional, mas é também um exemplo claro de como os serviços de entrega de encomendas tiveram de se adaptar e evoluir de forma a fazer face a desafios cada vez mais complexos de um mercado com potencial de crescimento enorme.

Quando se pensava nos CTT, todos críamos estar em presença de uma empresa que estaria em boa posição para tirar partido deste boom do comércio eletrónico e da entrega de encomendas. Afinal de contas, os CTT tinham uma experiência de décadas num serviço de que gozaram praticamente desde sempre de um quase monopólio. É certo que os CTT nunca perderam a imagem de empresa tradicional, com um negócio muito vocacionado para um serviço postal em franco declínio e uma certa vocação de distribuidor de reformas e vales postais, mas poucos achavam que fosse possível que uma empresa tão bem implantada deixasse fugir a possibilidade de lucrar com o enorme crescimento da distribuição de encomendas. Creio, mesmo, que muitos imaginaram que os CTT se viessem a especializar no óbvio negócio da entrega de encomendas, lutando por conquistar quota de mercado a empresas (algumas nacionais) que têm crescido de forma notável num mercado que é cada vez mais global. Muitos terão sonhado com uns CTT envolvidos nas experiências com drones para entregas cada vez mais automatizadas, com uma alocação de recursos muito focada no desenvolvimento de tecnologia e na luta por prestar um serviço cada vez mais rápido e eficiente.

Mas os CTT preferiram distribuir dividendos como fazem todas as empresas portuguesas que 1) viveram demasiado tempo encostadas a situações de exceção e anti-concorrenciais (como, no caso concreto, a distribuição de correio público) e 2) são autênticas vacas leiteiras que dão de comer a quem não tem qualquer visão estratégica de longo prazo, mas apenas está a pensar no presente.

Para complicar tudo o resto, os CTT acabaram geridos por quem vive no século passado e achou que uma empresa que distribui encomendas e vales de reforma deve apostar nos segundos em detrimento dos primeiros. Em vez de entrar em força no serviço de distribuição de encomendas, os CTT criaram um banco. Em vez de olhar para o futuro num negócio que, sendo desafiante, tinha tudo para poder ser próspero, decidiram virar-se para o passado, para um setor com taxas de rentabilidade baixíssimas no nosso país e onde enfrentam a concorrência de líderes mundiais (como p.e. o Santander). 

Não são os especuladores que estão a fazer cair as cotações dos CTT. Os especuladores são como o diabo: não existem! O que existe é gente desiludida; gente que apostou num dado pressuposto e que agora (tarde de mais para muitos) finalmente percebeu que a lebre é gato! O que existe é gente que quer ganhar dinheiro e já percebeu que não vai ser daqui que o vai tirar a não ser que aposte na queda! Os CTT nunca serão uma moderna empresa de entrega de encomendas virada para o futuro do comércio eletrónico mundial porque os seus gestores (pagos a peso de ouro) não tiveram tomates nem a inteligência necessária e preferiram apostar na banca. E tinha tudo para ser uma coisa diferente!

Quem anda nesta coisa dos mercados financeiros não se pode queixar da sorte ou da falta dela: em última instância, como tudo o mais na nossa vida, é tudo feito de decisões, de expetativas e frustrações! No final de 2015, os CTT ainda pareciam uma empresa de distribuição de encomendas e, embora a distribuição de dividendos não augurasse nada de bom para quem precisava de investir num setor com um potencial de crescimento tão grande, havia muitos a acreditar que o futuro poderia ser risonho. Então, veio a notícia de que iriam entrar na banca e, onde muitos viram uma opção de diversificação, outros, mais avisados, viram um olhar saudosista para o passado, em vez de uma aposta no futuro. Trocar o negócio global das encomendas na era da Internet por um banco chafarica de um país semifalido era tão deprimente que não foram poucos os que foram fugindo para bem longe! Esta semana, os CTT acabaram a valer quase 1/3 do que já valeram! Entretanto, continuam a pagar dividendos. Compensa? Claro que não! 

Em resumo, a lição a tirar é a seguinte: houve aqui um equívoco do mercado que começou por achar que estava em causa uma empresa preparada para tirar partido do negócio de encomendas online e agora tomou consciência de que afinal teremos um banco com serviço postal acoplado e carteiros  (os que sobrarem, entretanto!) convertidos em bancários! Esta semana, ao aperceberem-se do equívoco, os mais indefectíveis desmatelaram parte da posição que tinham; talvez tenham pensado que, para banco, não faltará melhor e que serviços de encomendas também os há noutras paragens! Agora, resta saber se, a valer 500 M€, os serviços que o CTT presta estão bem avaliados e se não haverá quem ainda precise de mais dicas para dar pelo equívoco!

É o diabo!


4 comentários:

  1. Concordo com a análise, bem fundamentada.

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  2. O banco CTT é uma miséria, 1 secretária encostada a 1 canto das poucas estações que o têm com um funcionário mal preparado e lento. Demora uma eternidade para se abrir a conta e ficar activa (15 dias por vezes) transferências também mais demoradas do que noutros bancos. Enfim... Falta de Know how, estrutura, back office e concorrendo com bancos muito melhores e num cenário de crise do sector. Uma vergonha de administração paga a peso de ouro que continua a descapitalizar a empresa atribuindo dividendos muito superiores ao lucro. Não demorará muito a ser novamente do estado.

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