21.1.17

Só para quem gosta de emoções fortes

Pedimos desculpa por voltar a falar do AC do BCP, mas, muito honestamente, não vemos outro assunto que seja tão importante como este neste momento, admitindo, bem entendido, que estamos numa casa em que se fala em essência sobre bolsa. Aliás, quem viveu as emoções dos 2 dias de negociação dos direitos de subscrição das novas ações não terá dificuldade em reconhecer que o potencial para se fazer ou destruir dinheiro é, neste momento, bem superior ao que é normal na negociata bolsista tuga. 

Julgo que agora entenderão melhor o "Agarrem-se bem" da semana passada e o "Só para quem gosta de emoções fortes" desta semana! Para além das jogadas que sempre envolvem aumentos de capital, a forma como este AC em específico está montado tem 3 ingredientes que o tornam especialmente merecedor da nossa atenção:
  • Em primeiro lugar, este é um AC de uma empresa que já fez imensos e em todos eles torrou dinheiro sem jeito. Imagino que não deve haver ninguém que tenha ganho dinheiro depois de o pôr num AC do BCP dos últimos, digamos, 10 anos e houve mesmo gente que perdeu todo o dinheiro que investiu, menos umas pipoquinhas! Para além disso, o BCP vem em quedas anuais sucessivas e só no ano passado desceu 70%, ao mesmo tempo que tem apresentado níveis de malparado que crescem mais rapidamente que as reservas que vão sendo constituídas, parecendo que se trata de um poço sem fundo de onde o dinheiro não escapa. Tudo somado, o pessimismo está em níveis estratosféricos e temos visto muita gente com perdas colossais finalmente a deitar a toalha ao tapete e a fugir para longe. À primeira vista, este seria portanto um aumento de capital para termos a emissão das novas ações acima do preço de mercado das antigas, com os direitos de subscrição a serem aniquilados até zero, como sucedeu, por exemplo, no AC que o BPI realizou em 2012. A propósito, diga-se que o BPI duplicou de valor pouquíssimo tempo depois do reforço de capital, que era de apenas 200 M€, 1/3 do valor do banco à época (e quadruplicou menos de 2 anos mais tarde). Para que se possam ver as coisas em perspetiva, colocamos o gráfico com esses valores:

Mas voltemos ao BCP e ao AC, que consideramos apimentado por mais estes dois motivos:
  • O rácio entre a cotação dos direitos de subscrição e o preço das novas ações tornou especialmente explosiva a negociação dos direitos. É que, estando o preço das novas ações já marcado nos 0,094€, e dando cada direito direito a comprar 15 novas ações, verifica-se que por cada 15 cêntimos de variação no preço dos direitos há uma variação de 1 cêntimo no preço das ações. Isto faz com que os direitos sejam parecidos, no que à alavancagem diz respeito, com warrants (ainda ontem vimos como o banco subiu 10% e os direitos quase 30%). 
  • Terceiro e mais importante: este é um AC em que há já uma ordem irrevogável de subscrição antecipada de um montante de ações, por parte da Fosun, de modo a passar a deter 30% do capital social do BCP. A Fosun (como se pode ler no ponto 4 do esclarecimento que a CMVM ontem divulgou na imprensa), compromete-se a exercer os direitos de subscrição que já possui, a comprar ações ou a adquirir direitos que lhe permitam reforçar no AC.
Este terceiro ponto é o que torna a negociação deste aumento de capital particularmente interessante, pois, embora possa haver muita pressão vendedora por parte dos desiludidos e de quem não quer dispor de mais dinheiro, temos aqui um anteparo que pode muito bem suportar o embate e até fazer subir bastante as cotações (vejam as nossas contas no texto da semana passada). 

Dissemos que a Fosun teria forçosamente que adquirir direitos para atingir os 30%, mas com o esclarecimento da CMVM parece-nos que há margem para que esse aumento de posição possa ocorrer até no pós-AC, sendo importante verificar o apuramento dos resultados no dia 3 de fevereiro: se a Fosun não estiver nos 30%, vai ter que ir ao mercado comprar ações! Como sempre, será uma questão de preço e de oportunidade e estamos em crer que, como já explicamos, a Fosun pode ter margem para comprar os direitos com um preço médio de 1,06€! Por outro lado, a Fosun entrou no BCP a 1,09€, preço que seria igualado se comprasse os direitos a 0,94€ e é importante notar que os chineses começaram por dizer que não gastariam no BCP mais de 2 cêntimos por ação (cotação antiga) e estes 1,09 são apenas 1,45 cêntimos, pelo que continuam a comprar a preço de saldo (de acordo com aquilo que eles próprios definiram há menos de meio ano)!

Restava-nos a dúvida do que faria a Sonangol, segunda maior acionista do banco com 14,87%. Na quinta-feira chegou a temer-se que os angolanos passassem os seus direitos fora de bolsa para os chineses, facto que retiraria muita da pica à negociação e poderia levar, inclusive a uma queda acentuada das cotações. O Público continua a dar conta, na edição de hoje, que o mercado dá como provável que os angolanos não avancem, ao mesmo tempo que acena com um regresso de investidores de peso portugueses como Américo Amorim. Porém, o Expresso de hoje já noticia que sabe de fonte próxima da petrolífera que a Sonangol vai mesmo reforçar dentro dos prazos estabelecidos e que a empresa já demonstrou junto do BCE ter fundos para injetar no banco (daí lhe ter sido concedida autorização para reforçar até 30%), apesar das dificuldades financeiras e de liquidez que tem estado a atravessar.

Promete!

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