31.10.14

O roubo

É uma arte que só se encontra ao alcance dos melhores negociar um índice que se encontra em zona de achaques como é o caso do PSI20. Ainda ontem, por esta hora, estávamos todos varados a tentar perceber de onde diabo tinha saído a ordem para um panic sell. De nenhures, bem entendido, mas o engano custou-nos um abalo no coração que se vai refletir de certeza na nossa qualidade de vida quando passarmos à idade da reforma. O que vale ao nosso índice campeão dos preços baixos é que os americanos vão encarreirados para máximos, e isso vai tornando cada vemos mais tentador colocar dinheiro em índices bearish, contando que mais cedo ou mais tarde a ursalhada hiberne. E o bearish por excelência temo-lo nós! É produto nosso e quem o quiser vai ter de vir cá acudir! É esse o nosso trunfo.

A zona de achaques do PSI20 situa-se abaixo dos 5300-5350 pontos. Abaixo desses valores, a coisa só se recomenda a corações fortes, havendo risco de despenque até aos 4450! Daí para cima, vamos contar que haja panic buy que projete rapidamente o maluco até aos 5750-5800. Confiram com os gráficos:



Há um aspeto que torna o PSI20 um caso especial entre os bearish. O índice não se pôs tão feio por a economia estar especialmente má, nem por os resultados das empresas estarem a sair piores que o esperado. Aliás, entre as empresas que compõe o índice há algumas que têm valorizações anuais interessantes, como é o caso da EDP (25%), da Renováveis (33%) ou do BPI (26%). O que rebentou connosco foi a tremenda desvalorização de 3 empresas que tinham um peso bastante grande na ponderação da cotação do índice. Falamos, evidentemente, da JMT (-50%), da PTC (-62%) e do BES (-100%).

O caso da JMT explica-se muito facilmente. Trata-se de uma empresa que estava sobrevalorizada porque havia a expetativa de que a Polónia era a galinha dos ovos de oiro e que a gerência da JMT era uma espécie de administração "Steve Jobs" das mercearias. É certo que os do Pingo Doce acertaram no joaninha (Biedronka) na Polónia e beneficiaram do facto de a concorrência se manter demasiado tempo agarrada a modelos errados. Também os ajudou o facto de o Alexandre Soares dos Santos aparecer na televisão a dar-se ares de grande conhecedor do mundo dos negócios e intrépido defendor das virtudes do self made man que ele nunca foi. Foi assim que, no ano passado, a JMT chegou a valer em bolsa mais de 7000 milhões de euros, ao passo que a Sonae (para usar como comparação uma empresa com um ramo de negócio similar) não passava dos 2000 milhões. Argumentava-se que a Sonae tinha um dívida maior e resultados mais baixos, mas, caramba, a Sonae não tem só supermercados e é muito mais internacionalizada. Daí que a queda da JMT só seja estranha a quem anda na bolsa a dormir ou por ver andar os outros. Quando as dificuldades apareceram e veio ao de cima a tremenda concorrência que existe no negócio da distribuição (veja-se o que acontece em cada uma das nossas cidades), começou por esvaziar o balão das expetativas e deu-se o ajuste à realidade, para logo em seguida começar a encher o balão do "isto é uma porcaria sem fim" que vai continuar a empurrar a cotação da Jerónimo em direção a novos mínimos.

O BES e a PTC são dois casos diferentes e deles já aqui falamos abundantemente. Tanto uma empresa como a outra foram alvo de saque a uma escala que só é possível em países sem estaleca como é o nosso. Foram dois roubos como não houve outros na épica história lusa. Quem foram os estarolas que se abarbataram com o pilim não vos posso aqui revelar (eu não fui) porque ao contrário deles ainda arranjo de ir preso, mas tomem nota disto que vos dizemos porque não haverá quem vos seja tão franco: foi tudo roubado e nada do que se passou foi incompetência ou inocência. Se analisarem como se resolveu a cena do BES Angola, vão perceber como este país foi e continua a ser saqueado por um comando de engravatados. Vão perceber por que motivo cada um de nós pode lutar o que quiser, estar tão preparado quanto é possível e agarrar todas as oportunidades que lhe apareça pela frente que, mesmo assim, a ganhar ordenados jamais sairá da cepa torta. Se se informarem sobre a forma como se desfez a PTC, vão compreender por que motivo os nossos filhos vão ter que emigrar para se safarem e a nós vão-nos continuar a castigar com a ameaça de corte nos salários, despedimento, bancarrota. A queda do PSI20 não é provocada por uma guerra insana como na Rússia, nem pelo gosto pela boa vida dos gregos. Nós somos um povo pacato, o mais deprimido e triste da Europa. Estamos dispostos a trabalhar à bruta por um ordenado de miséria e ouvimos as cantigas que põem a tocar no telejornal como se fossem cantigas de amigo. E assim entretidos e conformados vamos sendo roubados de uma forma que não existe em mais lado nenhum do ocidente. A queda do PSI20 foi provocada pelo roubo. E eu, em 20 anos que levo de bolsa, nunca tinha visto um índice que caísse tanto, nos países ocidentais, por causa de larápios!

23.10.14

Jogar na bolsa

O meu amigo Tavares sempre acaba os discursos com uma lista das vantagens de jogar na bolsa. Se fosse quando eu era chavalo mandava-o foder na hora porque me parecia inadmissível que se utilizasse o verbo jogar em vez dos muito mais solenes negociar ou investir, mas agora que o peso dos anos já me verga e estou numa de deixar a conversa fiada para trás, acho mesmo que isto é um joguito que nós para aqui temos. E já chego ao ponto de fazer ponto de honra em assumir sem rodeios que a bolsa não passa do meu petit casino e, desde que lhes deu na cabeça para inventar os smartphones, ando tão entretido com a jogatana que, de forma paradoxal, volto a sentir-me chavalo de novo! E que bem me sabe deixar para lá o peso de palavras como investimento e abraçar o jogo pelo jogo com touros e ursos como adversários. Demais a mais, com uma probabilidade de acerto às cegas de 50% não se pode dizer que o jogo seja fatela, sendo que muitas vezes se ganha quando se começa por perder o que, parecendo que não, torna a pipoca bastante mais doce. Bem vistas as coisas, chega a ser cómico forçar o verbo investir, porque quando se investe parte-se do princípio de que nos propomos criar valor, emprego, produtos, serviços, etc., e que peva criamos nós ao arriscar o nosso pilim na bolsa? Só se for aquela parte que passamos para as mãos do fisco quando nos calham mais-valias e também é possível que se entenda que o investimento está numa fase posterior quando, depois de se ganhar dinheiro no jogo da bolsa, se canalizam recursos para atividades produtivas. Claro que eu não conheço ninguém que, depois de aprender a fazer dinheiro sem trabalhar jogando na bolsa, lhe dê na cabeça pôr-se com ideias de investir numa caca produtiva. Valha a verdade que isso só acontece se o indivíduo estiver passado dos carretos e nem é preciso irmos aos gurus dos mercados para ver que nenhum teve a fraca ideia de se pôr com canseiras depois de dar umas tacadas acertadas no jogo da bolsa. Quando muito, pode haver quem pense que investimos quando participamos em aumentos de capital e entregamos o nosso cacau a gestores que sabem muito mais do que nós e não se importam de ter a trabalheira de criar valor, mas creio que não preciso de fazer um desenho para que aqueles que vão teimando nesta forma de investimento percebam que, mesmo nesse caso, tudo não passa de um jogo em que só ganharão se tiverem uma sorte estupenda! De maneira que agora, quando o Tavares me vem com a lista das vantagens de jogar na bolsa, já não me ponho a fazer orelhas moucas como se ele fosse um indíviduo que não percebesse nada do assunto, mas ouço-o com toda a educação e tento aprender para não me estender ao comprido tantas vezes. Da lista de vantagens já aqui demos notícia, pelo que só precisam de procurar no arquivo se estiverem mesmo interessados, mas há uma que acho pertinente ao ponto de voltar a escrever sobre ela. Assegura-nos o Tavares que a bolsa nos leva a viver de forma mais despreocupada e desafogada. How come?! Ora, se estás nos mercados porque te hás de preocupar em pagar uma tainada aos amigos de vez em quando ou gastar uma dinheirama numas excentricidades aqui e ali se podes perder ou ganhar muito mais do que isso numa reles jogada? O que te impede de pagar aquele casaco de polipele à Maria se tens o que ele custa preso numa variação de décimo de cêntimo do BCP? O que te impede se, ainda por cima, isso tornar o ambiente lá em casa mais propício a que se cumpram os regulamentos em matéria matrimonial? E o que te impede de ficar calado se o BCP arriar e abichares com um prejuízo no valor de vários casacos? Tudo a ganhar, portanto, e não há melhor jogo do que este para a harmonia do lar, desde que se cumpram as regras do mais elementar bom senso: engrandecer os pequenos acertos e calar nas grandes derrotas. Numa palavra: sensatez. Se assim for, assegura-nos o meu amigo Tavares, o jogo só tem vantagens, ainda que umas noites mal dormidas possam constituir um mal necessário. Não há bela, etc. Eu fico-me a pensar que pode haver aqui salvação para aqueles que ainda sofrem com a bolsa não ser mais do que um jogo. Ao jogarem ficam livres para encherem a casa de quinquilharia alegrando a economia, criando emprego e contribuindo para a redução do défice via IVA. O que é isso se não investir? É-o e já demonstramos que sim.

19.10.14

Russell2000 - Um barómetro



Depois de uma semana atípica, para aquilo que têm sido os últimos tempos, já se ouvem ecos de normalidade. Jim Cramer já anunciou na CNBC que pode-se de novo comprar ações. Uma vista de olhos pelos principais sites americanos sobre a bolsa e respira-se o mesmo otimismo. Quem somos nós para duvidar de Jim Cramer, mas um sinal fez-se notar neste ultimo mês, que, a ter sido percebido mais cedo, poderia ter sido útil para otimizar em warrants as quedas verificadas.

De facto, bem antes de todos os índices terem vindo por aí abaixo, o Russell2000 (súmula das cotizações das 2000 mais importantes small caps americanas), um “parente pobre” das estrelas S&P500 e DJIA, mergulhou de nariz, e, durante alguns dias parecia que ninguém ligava a isso. Aconteceu que os outros lhe seguiram as pisadas e, na semana passada, o ressalto foi anunciado com antecedência pelo Russell. 

Provavelmente, atingimos o fundo nesta correção, como o anunciaram este fim-de-semana alguns dos gurus da bolsa, mas o que é certo é que o Russell não acompanhou o otimismo dos outros índices no fecho de sexta-feira. Provavelmente indica unicamente que a subida não vai ser feita a todo o gás, mas convém estar atento para o comportamento do Russell e dos outros, a ver se a tendência de chefe de fila se mantém na subida.

16.10.14

Haverá ressalto?!

Neste momento, estamos todos com o dedo no gatilho para entrar e ao mesmo tempo com um caguefe dos diabos, não se vá dar o caso de a coisa despencar mal tomemos conta das ações que outro mais fino nos passar para as mãos. É a velha história do medo e da ganância: ninguém quer deixar fugir o bicho, mas também não estamos nada para ser atropelados pela infantaria. Se é que me entendem!

O que é certo é que o nosso índice de referência, que hoje conseguiu reassumir o segundo lugar nas piores bolsas mundiais (tinha-o perdido ontem para os gregos), leva quase 6% de queda semanal e está tão estrambolicamente sobrevendido que vai ser difícil justificar que amanhã não suba para desanubiar. Aliás, historicamente, são muito raras as vezes em que o RSI (indicador que mede a força relativa de um ativo) atingiu um valor tão baixo quanto o verificado hoje. Curiosamente, duas dessas vezes deram-se este ano, como podem ver no gráfico seguinte:


Num gráfico desde 2008 contamos 6 vezes em que o PSI20 esteve tão sobrevendido (medido em termos de RSI) quanto hoje e em todas elas deram-se ressaltos de pelo menos 5%. Neste momento, um ressalto dessa amplitude colocaria o índice na zona dos 5150 pontos, mas acreditamos que pode haver margem para uma subida a ir retestar os 5320 pontos (quedas bruscas dão também direito a subidas a rasgar). Claro que não é possível perceber se o ressalto se dará já amanhã ou daqui por mais algumas sessões, mas o comportamento dos restantes índices europeus e dos juros da dívida no final da sessão levam-nos a pensar que não somos os únicos com a ideia de que uma queda semanal de 6% é, pura e simplemente, um disparate!

Deixamo-vos também o gráfico do DAX, que hoje conseguiu fechar positivo, para que possam ver como os suportes funcionam e, em conjunto com um situação de sobrevenda (inédita no DAX desde 2011) podem espoletar uma mudança de sentimento no curto prazo.


Aliás, na nossa opinião, o comportamento do PSI20 nos próximos tempos vai estar fortemente dependente do que se passar nos restantes índices mundiais, sendo certo que o nosso índice tem historicamente uma grande tendência para antecipar as quedas e reagir ao retardador nas subidas. Nesse sentido, cremos que uma quebra do suporte dos 1815 pontos no S&P, que será acompanhado, sem dúvida, da quebra do suporte que marcamos no DAX, pode colocar o PSI no caminho dos 4400 pontos que já assinalamos num gráfico algures! Mas isto já são muitas conjeturas e o que nos interessa é o que se vai passar amanhã e no início da próxima semana!

Quanto a dados para amanhã, atenções para o mercado imobiliário americano e também para um sempre importante índice do sentimento dos consumidores publicado pela Universidade do Michigan que vê a luz do dia quando faltarem 5 minutos para as 3 da tarde.

Evidentemente, nenhum ressalto ressuscita o tourito, nem nada que se pareça, e todas as entradas têm de ser feitas com a parcimónia de quem não quer andar a fugir com as calças na mão. E é claro que há a possibilidade de a nossa conjetura não deixar de ser um mero caso de wishful thinking. Bem vistas as coisas, o facto de estarmos a falar em ressalto é bem capaz de ser sintomático de ainda não haver pânico suficiente para que ele ocorra. Bem, que se foda!

Amanhã saberemos melhor. Bons negócios para todos.

Explicações para o caos

Não há dúvida de que está toda a gente meio atordoada com a forma como tudo de repente se complicou tanto. Ainda ontem estava a ouvir a ministra das finanças a apresentar o OE do próximo ano e não pude deixar de pensar como tudo aquilo que estava a ser dito ficou desatualizado desde o dia da famosa reunião das 18 horas (quem ainda tem dúvidas é ver aqui). É evidente que todo o governo sabe disso, longe de nós de o pormos em dúvida, mas o nosso ponto é que este orçamento de estado é sintomático da forma como ninguém se apercebeu de que isto ia piorar tanto.

E por que motivo estão os números da economia a revelar uma fragilidade repentina tão grande que levaram os índices europeus e americanos de máximos históricos a um eminente bear market em poucos dias? O que aconteceu de tão catastrófico?

Eis a nossa tese.

Em primeiro lugar, as economias ocidentais, de forma muito especial, as europeias continuam incrivelmente fragilizadas porque, bem visto, nada de relevante foi feito desde que a crise rebentou em 2007. E esse estoiro de 2007 mais não é do que a consequência da acumulação de tensões resultantes de um sucesso pleno e excessivo que vem de há muito tempo. Uma das nossas últimas leituras, o livro Civilização, o ocidente e os outros, do historiador britânico Niall Ferguson, conta-nos de que forma o ocidente conquistou, desde o século XVI, uma posição de domínio global assente em 6 aplicações-chave:
  • Competição entre múltiplos estados que constituíam entidades corporativas concorrentes entre si;
  • Revolução científica com grandes descobertas na matemática, na astronomia, na física e na química;
  • Estado de direito e governo representativo;
  • Avanços na medicina, com controlo das principais doenças e epidemias;
  • Sociedade de consumo em conjunto com a revolução industrial;
  • Ética no trabalho e maiores taxas de poupança, com acumulação sustentada de capital.
Não custa nada perceber que todos estes aspetos em que o ocidente deu cartas e lhe permitiram ganhar vantagem ou foram postos em causa por culpa própria, ou foram copiados principalmente pelos asiáticos.

Hoje, pode-se dizer que estamos a ser vítimas do nosso próprio sucesso, como tem sido de resto norma em todas as civilizações da História que atingem um elevado patamar. E notem que não estamos a dizer isto por a bolsa estar a cair. A bolsa cai porque as pessoas têm medo, da mesma maneira que há de subir quando a ganância entrar em ação, independentemente de termos o nosso modo de viver posto em causa ou não. Aliás quem hoje vende na UE e nos EU pode até ser chinês e é muito duvidoso que esteja a vender por temer o fim da civilização ocidental. Portanto, não é esse o nosso ponto!

É verdade que se levaram a cabo uns planos de austeridade que conseguiram essencialmente desalavancar expetativas, mas do ponto de vista económico e financeiro nada de relevante mudou. As dívidas continuam elevadíssimas, os défices estão descontrolados e, acima de tudo, o desemprego mantém-se em níveis impossíveis. Mas também, valha a verdade, o problema não tem solução, porque a dinâmica das próprias sociedades tem tanta inércia que não há força que as consiga manobrar.

Quando olhamos para o OE 2015 e vemos que acabaram os cortes nas pensões entre os 1000 e os quatro mil e tal euros compreende-se por que motivo vamos mesmo ao fundo. Como é possível que se façam tantos ajustes e cortes e, ao mesmo tempo, se continue a pagar aquilo que sabemos ser impossível pagar. E não me venham com a treta dos descontos: os descontos que pagam reformas são os descontos de quem está atualmente no ativo. E também nos estamos verdadeiramente a marimbar para a mais do que estafada guerra geracional, que só serve para nos atirar areia para os olhos. Isto tem que ver com realismo. Como é que se mantém este estado de coisas quando uma percentagem tão grande da população está desempregada e a esmagadora maioria dos jovens ou não tem emprego, ou tem emprego escravo, ou emigra? Como é que se vão cortar 700 milhões em educação, e ao mesmo tempo se continuam a pagar milhares de pensões de reforma de 2000 euros para cima? Não há dúvida de que nós nos tornamos complacentes e perdemos por completo todos os trunfos que nos tornaram vencedores. E isto é uma corrente europeia, que se deu ao luxo de pensar que ao mesmo tempo que deixava falir as empresas que criaram a civilização ocidental, era possível manter privilégios que nem no paraíso celeste existiam. A ética no trabalho acabou porque não há trabalho (na melhor das hipóteses, temos biscates), e as maiores taxas de poupança que fizeram de nós investidores e empreendedores foram liquidadas pela geração que criou o sistema de pensões que agora contribui para rebentar connosco.

E é esta conjuntura de fragilidade e de bloqueio que é posta à prova pela crise ucraniana. Ainda hoje os jornais apontam o ressurgimento dos receios em relação à Grécia (seremos nós a seguir?) como a causa primeira para as quedas do dia. Mas erram o alvo. O regresso dos gregos (que decididamente continuam entretidos no pagode, a fazer na meia) resultam essencialmente da aflição alemã, que se estampou por causa das sanções à Rússia. Foi mal medido pelos políticos europeus, ou era inevitável que assim fosse? Enclino-me para a primeira hipótese, embora reconheça que não reagir às investidas do Putin seria mais perigoso do que uma crise económica.

É verdade que os russos também não estão melhor e, ao olhar para os preços do gás e do crude, fica-se com a ideia de que já perderam o às de trunfo. O problema para nós que estamos do lado de cá da barricada, é que, como assinalamos num post aqui colocado há algumas semanas, os russos estão sempre prontos para o combate (e se não estiverem, a vodca encarrega-se de impor tranquilidade), ao passo que nós temos demasiado a perder. Mesmo sem trunfos, Putin arrisca-se a sair vitorioso enquanto nós mantemos privilégios e bloqueamos quem quer e pode trabalhar. Se juntarmos a isso a guerra que vamos ter que travar contra o fanatismo medieval do estado islâmico e a guerra contra o medo de epidemias e de catástrofes naturais não vai ser preciso fazer muito esforço para perceber porque caem as bolsas.

15.10.14

E quanto tempo de bear market?

Sobre o PSI20 estamos conversados e é evidente para toda a gente que está tão bear que parece o Zé Colmeia.


O que interessa agora é ver como estão os índices que verdadeiramente contam, para que possamos avaliar quanto tempo teremos que esperar para poder ganhar dinheiro comprando ações.

A melhor forma de avaliarmos como os mercados estão fragilizados neste momento é através de um gráfico do S&P500, o índice americano das 500 maiores empresas a nível global:



O índice quebrou em baixa a SMA200 com algum estrondo na passada 2ª feira (notem que essa quebra já não ocorria há quase 2 anos), tendo ontem ensaiado uma reconquista da mesma que não resultou. Entretanto, hoje, pelo menos por ora, vai em contramão e afasta-se de maneira bastante comprometedora. Se fechar a subir vai dar sinal de vida, mas se arriar vamos vê-lo a aproximar-se dos 1815 pontos (linha preta a negrito), onde estamos em crer que poderá encontrar suporte, se calhar coincidente com o toque da EMA50 na média móvel 200. E é aí que tudo se vai jogar: uma quebra do suporte vai quase de certeza ativar uma death cross e voilá: bear market global! Mas pode ser, deus queira, que o suporte segure, como aconteceu em novembro de 2012 (ver 2º gráfico) e o morto ressuscite. Vai ser interessante de ver, mas não lhe toquem. Lembrem-se do ébola!

Para baixo é o caminho

Continuamos a ver muita gente à espera de uma inversão a todo o momento e muitos a contar com um retomar do bull market para breve. A nossa experiência diz-nos, contudo, que o touro já foi morto há muito, desmanchado e devorado. Por quem? Pelos ursos, quem mais?!

Ponham-se à tabela que com os números que têm saído (vejam os que saíram dos EU hoje às 13:30), e com a ameaça de mais de um milhão de casos de ébola para janeiro, nem precisamos dos gráficos para perceber que o cenário está para shortar. E isto não vos estamos a dizer para ser catastrofistas, nem nada que se pareça. É que quando os mercados caem, deixam de existir produtos baratos à venda, pois o que hoje é pechincha amanhã está de borla!

A nós, os portugueses, o que nos vale é que temos gestores muito competentes nas principais empresas e o governo já nos assegurou que a economia sobe 1,5% no próximo ano! Estamos a salvo, portanto! Ironiiiiiiiiiiaaaaaaaa!!!

Por que será que o PSI20 teima em tentar ser a pior bolsa do mundo? Aonde para a queda? Mínimo histórico abaixo dos 3000 pontos, como já ouvimos alguns avançar?! Só o Senhor poderá dizer! De qualquer das formas, num gráfico que postamos há uma semana vê-se um suporte por volta dos 4400 pontos. Sabemos que é uma esticadela, mas como as coisas estão, é garantido que nos pomos lá em 3 tempos!

Não se esqueçam do guarda-chuva!

11.10.14

Destruição

Sabeis qual é o índice bolsista que mais cai a nível mundial no presente ano? O russo! Mas a Rússia não admira, porque se arrependeu da perestroika e embarcou numa deriva imperialista que cheira ao mofo pavoroso dos tempos da II guerra mundial. 

E sabeis quem vem no segundo lugar do pódio? Nós, os tugas! Medalha de prata, portanto. Também não admira, uma vez que tal como os russos também nós estamos numa guerra. Uma guerra em que, infelizmente, só damos tiros nos nossos próprios pés. E nem vale a pena dizer que não somos nós individualmente os responsáveis por tanta munição mal direcionada. Não nos vale de nada dizer que não temos nada a ver com o assunto e que estamos a fazer tudo direitinho. E não nos adianta peva argumentar que nem gostamos da bolsa e que essas jogatanas não nos dizem nada porque nós somos indivíduos às direitas. No final de contas, com o PSI20 em modo voo picado, como esteve esta semana, ninguém escapa. Podem-nos vir dizer que o orçamento do próximo ano é o primeiro sem cortes, que estamos a sair do estado de emergência nacional e que um governo Costa vai ser mais amigo que os artistas Passos/Portas. Podem-nos cantar uma cantiguinha de embalar e nós até podemos adormecer, mas depois do BES e da PT terem sido destruídos é bom que preparem o corpinho porque o pau vai continuar a cair.

No início do ano, havia casas de investimento que apostavam em Portugal como um dos melhores mercados para investir e até finais de abril os números pareciam dar-lhes razão. O primeiro dos piigs estava em grande forma como fazia notar um jornalista do The telegraph e, após anos de impiedosa austeridade, estava na cara que só podia haver uma pujante recuperação.

O que ninguém contava era que os nossos Mourinhos da gestão, os special one da arte de manobrar empresas, saíssem tão maçãs podres. É evidente que uma empresa abrir falência é uma situação normal da vida e até seria de esperar que as empresas portuguesas tivessem que fazer um ajuste mais ou menos brusco depois da euforia de anos em que vivemos com a mania de que queríamos ser os melhores do mundo. Mas o que se está a passar em Portugal não é ajuste, e está para lá de uma falência em que por diversos motivos a empresa deixa de ser competitiva. Ao que estamos a assistir chama-se destruição. É saque e incompetência no mais alto grau. Depois do episódio BES, ter acontecido o que aconteceu à PT é mau de mais para a nossa reputação como país e tememos bem que muitos dos que cá estavam dispostos a investir, nos tomem agora apenas como um destino exótico em que vale a pena dar de vez em quando uns raides para sacar umas massas e fugir. Entregar a PT a uma empresa absolutamente medíocre e a uma gestão brasileira apenas interessada em sacar dinheiro devia-nos deixar com vontade de fazer justiça popular.

Para finalizar, deixamos um gráfico do PSI20 só para dizer que na sexta-feira foi ensaiada uma vela Portas, com muitos na expetativa que se lhe seguisse o mesmo que sucedeu em julho de 2013. Temos muitas dúvidas, até porque agora o irrevogável é mesmo para valer: ninguém ressuscitará o BES, e a PT é brasileira! De qualquer das formas, o pessimismo atingiu níveis tais que pode haver o ressalto por que tantos anseiam. Se isso acontecer, os 5320 são o primeiro grande teste e temos sérias e fundadas dúvidas de que possa ser superado sem que o ocorra algo surpreendente.




8.10.14

A caminho do suporte

Se nós vivêssemos num país rico, com uma queda anual de 17% no principal índice bolsista, não só estaria fora de questão ao governo em exercício vencer as eleições do próximo ano, como era muito provável que houvesse eleições antecipadas. Mas nem nós vivemos num país rico, nem o PSI20 representa o que quer que seja na economia portuguesa, nem os portugueses têm de uma forma geral a mínima ideia do que seja a bolsa. Para o tuga médio o máximo de risco a que mandam os cânones que esteja exposto é o do sorteio do euromilhões. Eis a nossa realidade triste e enfadonha e é com ela que temos que viver quer queiramos quer não!

Entretanto o nosso deslizante (sem atrito) índice encaminha-se a todo o vapor para o suporte em que tudo se decide (linha vermelha nos gráficos seguintes):



Ou a queda para aqui ou então, meus caros, há merda da grossa no horizonte e a nós ainda nos cheira a rosas (perdõe-nos os que estão a fazer a digestão, mas nesta casa falamos com o vocabulário todo).

Uma nota mais para os que estão a estranhar os péssimos números que vêm sendo publicados relativos à economia europeia. É bom que não se esqueçam que a Europa está em guerra com a Rússia e uma guerra, ainda que seja apenas um conflito económico, nunca causa baixas apenas de um lado. Aqui há uns meses atrás chamamos à atenção para esse facto e claro que não fomos os únicos a prever que iam ser postos à prova muitos suportes nos índices europeus.

4.10.14

Diversificar a longo prazo? Má ideia!

Há duas regras que é costume associar-se ao investimento nos mercados financeiros que não andaremos longe da verdade se afirmarmos que raramente deram dinheiro a ganhar a alguém, e que mesmo assim os especialistas continuam a enfiar aos incautos como se fossem atitudes do mais elementar bom senso. Referimo-nos à regra do investimento a longo prazo e à regra da carteira equilibrada e bem distribuída, a chama "lei dos ovos todos no mesmo cesto".

A primeira regra parte do princípio de que uma empresa cotada em bolsa crescerá inevitavelmente, ainda que possa passar por naturais períodos de maior indefinição ou até de decréscimo. É a crença nesta ideia, que creio vir do tempo em que as empresas tinham negócios protegidos, com fortes ligações ao poder político (veja-se o BES) e muitas vezes assentes em monopólios (veja-se a EDP), que faz com que, por exemplo, a revista Dinheiro & Direitos da Deco só recomende o investimento em ações a quem pode dispor do dinheiro por mais de 5 anos. É evidente que a maior parte dos leitores da revista não tem arcaboiço para acompanhar os mercados diariamente, nem estaleca para sobreviver mentalmente ao sobe e desce das cotações, pelo que, ao indicar um prazo de 5 anos para um investimento se procura eliminar queixumes e garantir uma certa sanidade mental aos mais afoitos. De qualquer das formas, empatar 5 anos o dinheiro num investimento e aguentar os altos e baixos impávido e sereno, é atitude que, nos dias que correm, não passa pela cabeça de ninguém. É que o mundo acelerou de uma forma tal e a imprevisibilidade é tão grande que pura e simplesmente não existem nenhumas garantias seja do que for. Num mundo tão aberto, nenhuma empresa está ao abrigo dos solavancos dos mercados, nem a salvo da ruína ou dos caprichos dos acontecimentos. Veja-se o caso, por exemplo, da Jerónimo Martins que ainda há pouquíssimo tempo era a empresa maravilha do PSI e hoje passa por sérias dificuldades em bolsa. Quem está disposto a manter JMT confiando que a operação colombiana vai correr pelo melhor e levar as cotações outra vez para cima? Até pode ser que sim, mas manter o dinheiro empatado, apostando nessa hipótese, é conselho que não se deve dar. Se a JMT voltar a justificar subidas nós vamos saber muito a tempo, pois a inversão de tendência saltará à vista, e podemos comprar nessa altura. Eu ainda não sou um rapaz entradote, mas lembro-me perfeitamente de conhecidos meus que, quando em andava na escola, iam para o Porto negociar ações diretamente na bolsa. Nesse tempo compravam-se papéis e guardavam-se no cofre. Hoje, que diabo, compram-se e vendem-se ações ao segundo a partir de qualquer lado onde estejamos. Se a coisa no curto prazo está a dar para baixo, vende-se. Quando a tendência inverter... compra-se! Mas esqueçam comprar ações e esquecer! Esqueçam o "no longo prazo tudo sobe"! Quem precisa da segurança do longo prazo deve abster-se de negociar em bolsa.

A segunda regra é uma antiga forma de defesa contra a nossa natural ignorância sobre o futuro. Na impossibilidade de garantir que o cesto dos ovos não caia ao chão e eles se percam, manda o bom senso que se distribuam os ovos por vários cestos. Nos mercados recomendam os expertos que também se constitua uma carteira equilibrada e diversificada. Não há de dar tudo para baixo ao mesmo tempo e, se houver descidas, haverá subidas para compensar. O problema é que assim não vamos a lado nenhum, nem é garantido que as descidas não sejam generalizadas. Os mercados dão tantas chatices e fazem-nos por vezes tanto mal que não nos podemos dar ao luxo de andar nisto para aquecer e pelo nervoso miudinho da luta. Não é possível ganhar num investimento arriscado e saturante para perdemos num conjunto de tiros mal dados para diversificar. Claro que nos fundos de investimento é necessário ter mecanismos de proteção das carteiras e uma distribuição sensata do capital porque os volumes são tão elevados que não é possível desfazer posições em tempo útil e há o risco de perdas catastróficas. Mas o comum dos mortais não se livra da trabalheira de tentar identificar oportunidades dentro de um leque alargado e decidir por um número pequeno de opções. A sensatez estará em jamais entrar com, digamos, mais de 1/3 do capital em apenas uma posição, mas diversificar não é uma atitude correta para minimizar risco, podendo ser meio caminho andado para nos entalarmos de forma definitiva.

Quem quer investir nos mercados tem que saber que pode perder! Aliás, tem que estar consciente que, mais cedo ou mais tarde, vai perder. Mas também vai ganhar! E a ideia é cortar as perdas rapidamente e deixar esticar os lucros. Para que isso aconteça, nem diversificação, nem longo prazo. Recomenda-se estudo, identificação de oportunidades e atenção. E, já agora, vir ao NeB.

Uma situação exemplar para finalizar. 

Há três semanas falamos aqui do BPI e dissemos que a perspetiva de o banco se poder perfilar para arrematar o NB por tuta e meia era capaz de ser suficiente para fazer subir as ações. Acertamos e o negócio correu bem. 

Entretanto a cotação foi lá acima à resistência imediata e começou a plissar. Vende-se! Não interessa se o negócio se vai concretizar ou não. A bolsa não vive de situações concretas, mas de expetativas. E a expetativa deu-nos 20 cêntimos para meter ao bolso. Se quebrasse a resistência avaliava-se uma possível reentrada. Como deu para baixo é porque há quem saiba mais do que nós e esteja a ver aquilo que nós ainda não vimos. Sensatamente mantemo-nos de fora a ver onde param as modas. Entretanto, soube-se que o Carlos Costa andou por Madrid a promover o NB junto dos espanhóis e hoje o Expresso noticia que há já vários bancos lá de Espanha que são capazes de estar interessados. Onde a notícia mais pica é quando anuncia que o La Caixa, acionista de referência do BPI, pondera avançar sozinho para a compra dos restos comestíveis do defunto BES. "Para integrar no BPI" sugere o jornal! E se não for?, perguntamos nós. Se o La Caixa entrar em Portugal comprando o NB a preço de saldo e puser a posição no BPI à venda? Como é que fica a cotação das ações do BPI com 20% do capital à venda, a ter que lidar com mais um concorrente e ainda por cima a ter que entrar com 10% da diferença de preço entre o empréstimo do Estado e o preço de venda? Não sei se nos estão a seguir?! Não dizemos que vá ser assim ou de outra forma, nem sequer avaliamos probabilidades. O que queremos demonstrar é que o cenário de negócio chorudo para o BPI azedou um bocado e as cotações já refletiram isso. A nossa missão nos mercados é sempre tentar antecipar toda esta jogatana e, à falta de informação priveligiada, temos os gráficos, mas disso não falamos hoje que a conversa já vai longa.

Cuidem-se que os mercados não estão para arrivistas!