31.7.16

BCP

É uma opinião não avalizada nem comprometida de quem detém zero BCP, mas os resultados do banco, publicados na sexta-feira, pareceram-me melhores que o esperado, se atendermos ao facto de a banca portuguesa estar a ser apontada por quase toda a gente como uma das mais problemáticas do mundo, tendo-me saltado à vista o grau de cobertura para crédito vencido há mais de 90 dias ter passado para quase 94%, o que pode significar que as provisões feitas à custa de prejuízo deixam margem para algum conforto (por comparação com o NB, por exemplo, o BCP parece bem melhor colocado). Já os números divulgados relativamente aos testes de stress, e que justificaram o reforço de provisões para que não se desse nenhuma desgraça, para além de fraquitos (vejam com quem compara), serviram para ajudar a amenizar o estrago de um prejuízo com que ninguém contava, mas a sua importância extinguir-se-à com a mesma velocidade com que se extinguiu das outras vezes. 

Do lado menos bom, a confirmação de que a rentabilidade é baixíssima (prejuízo em Portugal no 2º trimestre), e um resultado líquido que praticamente garante que o banco ou realiza um aumento de capital ou falha o pagamento das obrigações convertíveis em capital (CoCos) na data prevista. Recorde-se que o BCP tem que devolver 750 M€ (tem a entrega de 250 M€ em curso e pendente de aprovação) que ainda deve até junho de 2017, sob pena de as obrigações se transformarem em capital detido pelo estado com um desconto de 35%. Como esta alternativa seria o fim do banco como entidade privada (à cotação atual significaria que o estado ficaria dono de 49,2% do banco), o BCP está mesmo condenado a reforçar-se, mesmo que não houvesse outros motivos (e há: atenção aos baixos rácios de capital).

Ora, é neste contexto que surge a oferta da Fosun. Sobre ela o que temos a dizer é o que se segue. 16,7% a 2 cêntimos não chegam a 237 M€ o que é chicha para a cova de um dente (QED), pelo que o negócio só fará sentido se os chineses estiverem dispostos a injetar bastante mais cacau. Dizem que querem chegar aos 30%. Evidentemente, não os estamos a ver a entrar no BCP para depois deixarem que o estado se torne acionista daqui por menos de 1 ano, pelo que podemos fazer um exercício académico engraçado: assumindo que o BCP só precisa de 500 M€ para liquidar os CoCos e que é a Fosun que os vai fornecer, teríamos que aumentar o resto do capital (13,3%) a 0,0280€! Interessante!

À primeira vista, do lado chino, o negócio parece bom de mais para ser verdade, ainda por cima se compararmos com os valores de que se falou no ano passado sobre as propostas que fizeram para a compra do NB. Mesmo que o BCP tenha que fazer a seguir um AC de 2000 M€, valores que têm sido apontados em alguma imprensa, o facto de se posicionarem já com 16,7% do capital a preço de uva mijona garante-lhes que conseguirão a posição pretendida gastando pouco mais de 500 milhas. Para uma empresa com uma capitalização de mais de 11 mM de dólares não parece grande espiga! É o chamado negócio da China!

Aliás, o negócio é tão interessante que, apesar dos pesares, pode ser que apareça oferta concorrente, visto o fim-de-semana ter mostrado que, mesmo para o pior do teste há gente disposta a acudir, desde que o preço seja o adequado, evidentemente. E é possível que a caminhada feita em bolsa pelo BCP este ano (queda de 60%) tenha tornado o preço adequado!

Posto isto, que dizer relativamente ao futuro da cotação?

Um AC é mau porque dilui a posição dos acionistas uma vez que são produzidas novas ações. No caso do BCP, não só havia a quase certeza de que o AC teria que ser feito, como persistia também a dúvida sobre se existiriam interessados em acudir ao peditório, uma vez que, como toda a gente sabe, o BCP é campeão no que toca a trucidar quem vai aos seus aumentos de capital! Ora esta segunda dúvida cai por terra com o avanço chinês, ao mesmo tempo que parece desaparecer o risco de entrada do estado no capital. Quanto ao problema da diluição, julgamos que quem tinha medo de ver a posição percentual diminuída teve mais do que tempo para abandonar o barco, pelo que sair agora parece um sell on the news muito pouco racional (a menos daqueles que não gostam de capital chinês e preferem fugir a sete pés). Portanto, estamos em crer que estão reunidas as condições para que se dê uma subida de jeito nas cotações, uma espécie de buy on the news (uma nota que é apenas curiosa para dizer que o BCP subiu 50% na semana a seguir ao anúncio do último AC em junho de 2014 - claro que, entretanto, caiu 86%, mas isso agora não interessa para nada)!

Do ponto de vista técnico, houve sinal de compra na sexta-feira, mas vamos precisar de fechar acima dos 0,0216, para ativar uma possível ida aos 3 cêntimos (há ali um canal com topo nos 0,0264 que em caso de panic buy e short squeeze não nos parece relevante). Para baixo, não vemos referências de maior e é possível que um fecho muito negativo amanhã seja o prenúncio de novos mínimos. Seja como for, vai ser interessante de ver!


Nas próximas semanas estarei de férias e só virei aqui larachar se a situação me deixar mesmo cheio de vontade. De qualquer das formas, deixo para publicação automática, ao longo da primeira metade do mês de agosto, dois textos que vão saindo em fascículos. Um é um texto de ficção que escrevi quando não tinha nada melhor para fazer, chamado "O capital ista", mas que não tem nada que ver com capital. O outro é a reposição da primeira "história de dinheiro" que publicamos originalmente há dois anos.

Votos de boas férias para todos!

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