É uma arte que só se encontra ao alcance dos melhores negociar um índice que se encontra em zona de achaques como é o caso do PSI20. Ainda ontem, por esta hora, estávamos todos varados a tentar perceber de onde diabo tinha saído a ordem para um panic sell. De nenhures, bem entendido, mas o engano custou-nos um abalo no coração que se vai refletir de certeza na nossa qualidade de vida quando passarmos à idade da reforma. O que vale ao nosso índice campeão dos preços baixos é que os americanos vão encarreirados para máximos, e isso vai tornando cada vemos mais tentador colocar dinheiro em índices bearish, contando que mais cedo ou mais tarde a ursalhada hiberne. E o bearish por excelência temo-lo nós! É produto nosso e quem o quiser vai ter de vir cá acudir! É esse o nosso trunfo.
A zona de achaques do PSI20 situa-se abaixo dos 5300-5350 pontos. Abaixo desses valores, a coisa só se recomenda a corações fortes, havendo risco de despenque até aos 4450! Daí para cima, vamos contar que haja panic buy que projete rapidamente o maluco até aos 5750-5800. Confiram com os gráficos:
Há um aspeto que torna o PSI20 um caso especial entre os bearish. O índice não se pôs tão feio por a economia estar especialmente má, nem por os resultados das empresas estarem a sair piores que o esperado. Aliás, entre as empresas que compõe o índice há algumas que têm valorizações anuais interessantes, como é o caso da EDP (25%), da Renováveis (33%) ou do BPI (26%). O que rebentou connosco foi a tremenda desvalorização de 3 empresas que tinham um peso bastante grande na ponderação da cotação do índice. Falamos, evidentemente, da JMT (-50%), da PTC (-62%) e do BES (-100%).
O caso da JMT explica-se muito facilmente. Trata-se de uma empresa que estava sobrevalorizada porque havia a expetativa de que a Polónia era a galinha dos ovos de oiro e que a gerência da JMT era uma espécie de administração "Steve Jobs" das mercearias. É certo que os do Pingo Doce acertaram no joaninha (Biedronka) na Polónia e beneficiaram do facto de a concorrência se manter demasiado tempo agarrada a modelos errados. Também os ajudou o facto de o Alexandre Soares dos Santos aparecer na televisão a dar-se ares de grande conhecedor do mundo dos negócios e intrépido defendor das virtudes do self made man que ele nunca foi. Foi assim que, no ano passado, a JMT chegou a valer em bolsa mais de 7000 milhões de euros, ao passo que a Sonae (para usar como comparação uma empresa com um ramo de negócio similar) não passava dos 2000 milhões. Argumentava-se que a Sonae tinha um dívida maior e resultados mais baixos, mas, caramba, a Sonae não tem só supermercados e é muito mais internacionalizada. Daí que a queda da JMT só seja estranha a quem anda na bolsa a dormir ou por ver andar os outros. Quando as dificuldades apareceram e veio ao de cima a tremenda concorrência que existe no negócio da distribuição (veja-se o que acontece em cada uma das nossas cidades), começou por esvaziar o balão das expetativas e deu-se o ajuste à realidade, para logo em seguida começar a encher o balão do "isto é uma porcaria sem fim" que vai continuar a empurrar a cotação da Jerónimo em direção a novos mínimos.
O BES e a PTC são dois casos diferentes e deles já aqui falamos abundantemente. Tanto uma empresa como a outra foram alvo de saque a uma escala que só é possível em países sem estaleca como é o nosso. Foram dois roubos como não houve outros na épica história lusa. Quem foram os estarolas que se abarbataram com o pilim não vos posso aqui revelar (eu não fui) porque ao contrário deles ainda arranjo de ir preso, mas tomem nota disto que vos dizemos porque não haverá quem vos seja tão franco: foi tudo roubado e nada do que se passou foi incompetência ou inocência. Se analisarem como se resolveu a cena do BES Angola, vão perceber como este país foi e continua a ser saqueado por um comando de engravatados. Vão perceber por que motivo cada um de nós pode lutar o que quiser, estar tão preparado quanto é possível e agarrar todas as oportunidades que lhe apareça pela frente que, mesmo assim, a ganhar ordenados jamais sairá da cepa torta. Se se informarem sobre a forma como se desfez a PTC, vão compreender por que motivo os nossos filhos vão ter que emigrar para se safarem e a nós vão-nos continuar a castigar com a ameaça de corte nos salários, despedimento, bancarrota. A queda do PSI20 não é provocada por uma guerra insana como na Rússia, nem pelo gosto pela boa vida dos gregos. Nós somos um povo pacato, o mais deprimido e triste da Europa. Estamos dispostos a trabalhar à bruta por um ordenado de miséria e ouvimos as cantigas que põem a tocar no telejornal como se fossem cantigas de amigo. E assim entretidos e conformados vamos sendo roubados de uma forma que não existe em mais lado nenhum do ocidente. A queda do PSI20 foi provocada pelo roubo. E eu, em 20 anos que levo de bolsa, nunca tinha visto um índice que caísse tanto, nos países ocidentais, por causa de larápios!