A propósito da estreia de Mr. Turner, o novo filme de Mike Leigh, deu-nos para vos apresentar os votos de Bom Ano Novo sob a forma de um díptico com duas pinturas de William Turner, o pintor das tempestades, cuja biografia fornece argumento ao filme.
Que em 2015 a nossa Bolsa possa passar da tempestade:
Naufrágio, William Turner, 1805, Tate Museum
para um cenário bem mais dourado:
O ramo dourado, William Turner, 1834, Tate Museum
Entretanto, se isso não acontecer, não deixem que faltem coisas boas na vida.
Fomos dos que achamos excelente a jogada da Isabel dos Santos quando resolveu avançar com a OPA à PT e escrevemos aqui que o lance fazia todo o sentido, do ponto de vista dos angolanos, se queriam diversificar e tornar-se dominadores na indústria das telecomunicações em língua lusa. De uma assentada, e a preço de amigo, os de Angola passavam a perna aos lorpas lusos e condicionavam a tarefa dos finórios brasucas, ficando com uma operação bem montada e relevante em três continentes. E isto sem terem de passar pela estafadela de criar uma empresa de raíz. Teoricamente, era muito bem jogado, do ponto de vista estritamente empresarial. Sendo assim, evidentemente, cumpria-nos o papel de entrar na PT para aproveitarmos uma possível subida do preço da OPA ou, quiçá, o aparecimento de ofertas concorrentes. E assim se fez, sendo que a princípio houve mais gente que concordou com o nosso raciocínio e a PT chegou a negociar nos 1,60€, 18% acima do valor oferecido pela engenheira angolana.
Mas então começaram a aparecer motivos para dar razão aos que duvidaram desde o início da exequibilidade da operação, ao mesmo tempo que nem a Isabel se mostrou por um segundo interessada em subir a parada, nem se viu quem pudesse entrar com uma proposta concorrente. Como o preço também começou a arriar, nem pensamos duas vezes e fechamos a loja enquanto ainda havia lucro para embolsar. Está visto que fizemos bem! Para além de todos os obstáculos que apareceram no caminho, fica-se com a ideia de que, com a queda do preço do petróleo, houve corte da semanada no palácio presidencial em Luanda, e o sonho angolano da genial engenheira foi-se com o vento, tal como antes tinha ido o sonho lindo do Zeinal Bava!
Temos, portanto, a PT reduzida à condição de SGPS de uma única participação social, os 25,6% com que ficará do negócio da atual Oi (embora esta percentagem não seja pacífica, como podem verificar aqui). A essa participação há que acrescentar uma opção de compra até um máximo de 37,3%, caso receba os 900 e tal milhões que tem entalados no BES mau. Sendo assim, as contas para o valor da PT são fáceis de fazer: temos 25,6% do valor da Oi mais os milhões que é expectável receber do bolo que voou com o Espírito Santo.
Hoje a Oi fechou a valer 2324 milhões de euros, donde resulta um valor para a PT de 595 M€ ou cerca de 0,66€ por ação. A este valor há que somar cerca de 1 euro se acharem que a PT pode reaver o total dos 900 milhões. Feita a regra de 3 simples, com o fecho de hoje, temos o mercado a contar que a PT é capaz de receber 229 milhões de euros do BES mau. Parece muito, tanto mais que no fim-de-semana ficamos a saber que o Goldman Sachs se juntou à lista dos que se vão pôr na fila de mão estendida. Não admira, pois, que a PT tenha hoje marcado um mínimo histórico em fecho!
Do ponto de vista técnico, havia ali uma hipótese de duplo fundo que terá levado alguns a arriscar umas compras antes do fim-de-semana passado, mas, com a queda de 7% da Oi na passada sexta-feira (a Oi realizou um reverse stock split que veio dar força mental aos que estão convencidos que devem vender), e as notícias do entalanço do Goldman, o bota abaixo de hoje era expectável.
Agora estamos tão sem referências como sem motivos que justifiquem uma ida a jogo, a não ser que acreditemos que pode haver uma espécie de luta por posições para decidir a venda ou não da PT Portugal à Altice na assembleia geral do próximo dia 12 de janeiro. Nesse caso, podemos ter uma subida do interesse na PT nos próximos dias, uma vez que a data limite de registo de titulares de ações na AG é sexta-feira. Também temos o mínimo histórico absoluto ali nos 0,865€, que pode servir de suporte e derradeira oportunidade para os que têm fé no tal duplo fundo. Seja como for, a cotação da PT vai continuar mais ou menos atrelada à da Oi (hoje esteve a cair quase 6% e fechou a marcar menos 1,4% que na sessão passada), mas também vai refletir o que se passar na luta de credores do falecido BES e, provavelmente em menor grau, o câmbio BRL/EUR.
Seja como for, meus caros, nós que andamos nisto há algum tempito sabemos que é nestes lances, em que a situação parece desesperada, e a maioria já dá por adquirido que a melhor solução é enfiar a empresa no cesto do lixo, que nos devemos começar a interessar mais por acompanhar a evolução das cotações. Com 70% de queda anual, vai sendo tempo de olhar para o potencial da nova empresa que surge depois de 12 de janeiro (se é que a Altice paga mesmo metade da dívida da Oi/PT), e verificar se não estaremos perante um bom negócio!
Creio que não há um de vós que acredite ser possível, nos tempos que correm, fazer previsões sobre movimentos no mercado para além de uns dias no futuro. E já assim se arrisca bastante e raramente a coisa funciona! São tempos loucos estes em que vivemos, de uma avassaladora torrente de factos e acontecimentos, que nos esticam os neurónios ao ponto em que só com muito treino somos capazes de manter a sanidade mental em níveis aceitáveis. Nem tempo temos para digerir os factos estupendos com que vamos sendo empanturrados a ritmo regular e crescente, quanto mais para nos entretermos com previsões que sabemos de antemão serem absolutamente inúteis! E mesmo a mente mais arrojada e o previsor mais apocalíptico tem dado por si atropelado por factos que deixam o quadro traçado infinitamente abaixo do que vem a ser a realidade. É um fenómeno que, se formos bíblicos, facilmente nos levará a pensar em fins do mundo ou regresso do messias. Má onda para os astrólogos e os profetas, não fosse o ser humano dotado da capacidade para esquecer facilmente sempre que a bota não bate com a perdigota!
Quem diria há um ano atrás que o BES deixaria de existir (há um ano, não faltavam casas de investimento a dar preços-alvo para o BES acima dos 1 euro, e havia até quem dissesse que cada ação podia valer mais do que uma moeda das grandes)? Quem podia prever que a PT ia deixar cair o P, para passar a ser apenas um T trocado entre brasileiros e franceses? Que profeta previu, há um ano, que íamos ter um ex-premier enjaulado em Évora? E quem seria tão pessimista ao ponto de partir do princípio que, com uma saída limpa do programa de ajustamento, o PSI20 cairia mesmo assim quase 30%? Etc!
É verdade que o ano foi um fartote, um autêntico Cisne Negro (como assinalava ontem, no Expresso, João Vieira Pereira), mas a nossa tese é que a probabilidade de se darem acontecimentos que baralham por completo as circunstâncias subiu brutalmente nos últimos anos e tornou a arte de prever numa lotaria de probabilidade ainda mais baixa do que a normalidade sempre impõe. De maneira que nós, em condições normais, nem nos atrevemos a prever para além do que se vai passar nos próximos dias. E mesmo isso, costuma ser feito de gráficos em punho e com enorme reserva porque o final de ano, como a malta anda com os pirolitos descompassados, presta-se a fenómenos estrambólicos que fazem temer o pior.
Em condições normais, esta última semana em que hoje entramos seria a derradeira para limpeza de carteiras, com reforço das menos-valias de modo a equilibrar o IRS e arrancar no próximo ano com a conta a zeros. Como há falta de liquidez, a descarga costuma levar a uma queda das cotações, a que se segue uma subida nas primeiras semanas do ano, com a constituição de novas carteiras. Essa costuma ser a situação normal e é habitual fazerem-se ótimos negócios comprando, pela calada, nesta última semana.
Desta vez, contudo, é possível que muitos dos que tinham perdas para lavar já o tenham feito há algum tempo atrás, porque o PSI20 tem dado mais do que evidentes sinais de que para baixo é o caminho, de maneira que me quer parecer que quem ainda não fechou já não vai fechar, porque a dor da perda é tão insuportável que nem o acumular de menos-valias para efeito de impostos os consegue demover. Claro que se pode vender e comprar logo a seguir, que a coisa fica como está, mas convencê-los disso?
Assim sendo, isto parece um pouco mais difuso este ano!
Felizmente, temos os gregos, esses fundadores da democracia que vêm em nosso auxílio, de modo a podermos prever com um pouco menos de irracionalidade.
Como previsto(!), os gregos deixaram para a última jornada a possibilidade de evitar eleições legislativas antecipadas, que se parecem prestar a colocar o Syriza no poder. E a última rodada da eleição presidencial é amanhã, segunda-feira. Se houver fumo branco e o problema ficar resolvido, teremos eleições apenas no final do próximo ano e é um problema sério que sai, de momento, do radar dos investidores. Nesse caso, estamos em crer que dificilmente os índices europeus não marcarão novos máximos históricos, no início do ano, (exceto o PSI20, bem entendido; a propósito, diga-se que o nosso belo índice precisa de subir quase 200% para estabelecer um novo recorde; ficamos todos ricos, carago). Olhando para o fecho de semana no índice grego parece que o otimismo não é elevado, mas pode ser que haja intervenção dos deuses do Olimpo. Se a coisa der para trás, temos eleições em fevereiro e estaremos entregues ao pior inimigo dos mercados: a incerteza! Nesse caso, só o BCE nos pode trazer boas notícias capazes de travar a queda!
Afinal, até nem é difícil prever! Vamos ver se bate certo!
Com cada vez menos tempo e mais labuta padeceu a leitura, que viu o tempo disponível ser cortado para um mínimo, que começa a roçar o limiar abaixo do qual é o próprio crescimento intelectual que acaba por ficar em causa. O problema é que se não se investe nesta área, não é possível crescer em conhecimento relativo e, sem isso, é dado adquirido que escafedemos na Bolsa quando os mercados se tornam um pouco mais agrestes. Neste ano, por exemplo, valeram-nos em grande medida leituras passadas, porque com o que levamos à prática bem nos tínhamos entalado e ficado sem conserto. Há, portanto, todo um trabalho de gestão do tempo que é preciso executar com precisão, de modo a chegarmos ao 31 de dezembro com um cesto de livros lidos que assegurem que não entramos em recessão ou, pior, depressão ou, ainda mais grave, senilidade!
Não se pode dizer que o ano tenha sido estupendo em termos de qualidade dos livros lidos, mas também é verdade que com a idade nos vamos tornando mais exigentes, ao mesmo tempo que vamos deixando lidos os títulos consensuais, fazendo da escolha de livros a ler toda uma arte de procura de preciosidades escondidas.
O melhor livro do ano entrou diretamente para 32º lugar do Top N€B geral e é da autoria do historiador escocês Niall Ferguson, de quem já conhecíamos outras obras merecedoras de atenção. Trata-se de Civilização, o Ocidente e os Outros (Civilização Editora, 2011) e conta-nos por que motivo o ocidente se transformou na civilização global dominante em deterimento de outras como, por exemplo, a chinesa, que teriam, aparentemente, melhores condições de partida.
Com um estilo fluído e enxuto, bastante bem documentado, sem ser demasiado superficial nem académico, Ferguson fornece-nos um conjunto de pistas que nos servem inclusivé para a nossa luta diária. No final, o sucesso do Ocidente acaba resumido em seis aplicações-chave decisivas (a que já nos referimos num post anterior): competitividade entre nações, revolução científica, estado de direito, medicina moderna, sociedade de consumo e ética no trabalho. Ferguson tem uma apresentação no Ted Talks sobre o assunto que aborda no livro, que vale a pena ver como complemento.
Numa altura em que a Europa corre o sério risco de se desagregar, não deixa de ser sugestivo que uma das teses do livro seja precisamente o facto de ter sido a profunda desunião entre os diferentes países europeus, que lutavam cada um por si, estabelecendo e rompendo alianças à velocidade a que mudavam os humores dos diferentes governantes, um dos fatores que levaram o nosso continente para o domínio global. Em tese, desunião leva ao sucesso, ao passo que a união e a ausência de conflitos conduz ao comodismo e à estagnação como sucedeu, lá está, com os chineses. No fim somos obrigados a refletir se não estaremos nós, os humanos, condenados a só ter sucesso individual se estivermos desunidos. Estará o Universo formatado para não passar de um jogo de soma nula em que o sucesso de uns só é possível se conseguido à custa da perdição de outros? E estaremos nós, os europeus, em vias de desmantelarmos a nossa união porque com ela não conseguimos manter o estatuto de líderes civilizacionais? Ou será que, por outro lado, é esta obsessão pela liderança, seja do que for, que nos está a tolher? Olhando para o passado e para o quanto nos custou tornarmo-nos na "Civilização" será que vale a pena voltar a pagar o preço de uma suposta liderança e de passarmos por líderes abdicando do conforto de nos sentirmos unidos? Perguntas que ficam em aberto no livro, mas que valem só por termos tido a possibilidade de as colocarmos a nós próprios. Até porque, pelo andar da carruagem, podemos perfeitamente, no nosso tempo de vida, vermo-nos na contingência de termos que optar por um ou outro caminho!
O segundo livro do ano foi a biografia de Casanova, História da minha vida, numa edição da Divina Comédia Editores, 2013.
Já falamos deste livro aqui e a verdade é que foi para nós um dos grandes acontecimento editoriais do ano. Já existiam em português alguns extratos da obra de Casanova, entre os quais a "História da minha fuga das prisões de Veneza", mas nunca se tinha ido tão longe na tradução para a nossa língua da epopeia de um sujeito que é acima de tudo conhecido como um competente galanteador. A tradução de Pedro Tamen também é bastante competente e a única chatice é que mesmo com esta colheita ainda só foi possível ter em português (pelo menos de Portugal) cerca de 1000 das mais de 4000 páginas que compõem o texto completo. Mesmo assim, o livro é um fresco dos três quartos finais do século XVIII europeu vistos pelos olhos de um homem que passou por grande parte do continente e esteve presente em muitos dos acontecimento definidores da nossa maneira de ser e de pensar. De Portugal, infelizmente, Casanova pouco mais refere do que ter sentido uns pequenos estremeceres do chão na prisão dos chumbos, onde estava no fatídico dia 1 de novembro de 1755, quando Lisboa foi destruída pelo tremor de terra. Mas é um gosto, apesar dos saltos que a narração vai dando, para cumprir o objetivo de ter a obra condensada em 25% do original, descobrir como o mundo de há 200 e tal anos atrás não é assim tão diferente do nosso, apesar dos gadgets sem os quais a vida atual quase parece impossível! Casanova não dispensa o jogo, nem a arte da negociação e do saber investir, e domina as relações humanas com uma competência que se torna uma lição segui-lo nas manobras que vai levando a cabo. Bem sabemos que 1000 páginas de leitura é uma empreitada que só se pode levar a cabo, nos tempos que correm, se houver lucro garantido. Ora, neste caso, o projeto vale cada minuto investido!
Numa passagem de Kaputt, Curzio Malaparte relata-nos o encontro que teve com Ante Pavelic, o ditador croata, no outono de 1941. A dada altura, Pavelic sentencia que o povo croata quer ser governado com bondade e justiça. E eu estou aqui para garantir a bondade e a justiça. Malaparte ouve-o enquanto observa um cesto de vime posto em cima da escrivaninha. Como a tampa estava um pouco levantada, via-se que estava cheio de mariscos, ao que parecia ostras tiradas das cascas. Pavelic apercebe-se do interesse do interluctor e, lavantando completamente a tampa do cesto, disse a sorrir, com o seu sorriso bom e cansado: É um presente dos meus fiéis ustacia. São vinte quilos de olhos humanos.
Kaputt significa quebrado, destruído, e parece certo que nunca estivemos tão perto de estar kaputt como nos anos desgraçados da segunda grande guerra. A experiência de repórter de guerra italiano, fazendo a cobertura dos acontecimentos, pelo lado do eixo, que serve a Malaparte para compor o seu livro, constitui um murro no estômago para todos aqueles que acham que pode haver um pingo de dignidade na guerra e que em última instância a racionalidade há de fazer do ser humano um animal menos feroz que o pior bicho da selva. Nada mais falso. O homem consegue sempre justificação moral para a pior e a mais cobarde decisão que seja obrigado a tomar pelas circunstâncias que se lhe apresentam. No final, como dizia Samuel Johnson há sempre o patriotismo que tudo submeterá: o patriotismo é o último refúgio de um canalha!
Kaputt de Curzio Malaparte (edição livros de bolso Europa-América, 1979) é a terceira melhor leitura N€B do ano.
Em ano de centenário da primeira guerra total, e quando parecem avolumar-se nuvens de tensão outra vez sobre a Europa, é bom recordarmos o testemunho de quem já passou por experiências que parece possível que ainda sejam olhadas como tendo qualquer coisa de aliciante: veja-se o caso dos jovens europeus seduzidos para a luta do estado islâmico. Malaparte, apesar de seguir de perto a quadrilha nazi, não é imparcial na guerra e tem plena consciência do lado pelo qual vale a pena lutar, talvez porque tem a bagagem intelectual suficiente para compreender que os horrores de que nos vai dando conta não são compatíveis com o ser pensante que nos costumamos considerar, mas não encontra muitos como ele e, mais do que a história da guerra contada por quem a viveu, é justamente essa tomada de consciência de como estamos tão perto da selvajaria que nos enche a mente depois de termos lido este livro. Kaputt, de Curzio Malaparte, entrou para o lugar 47 do top de leituras N€B.
É bastante raro um filme ser melhor que o livro que lhe serviu de argumento, mas no caso do nosso melhor filme do ano foi justamente isso que aconteceu.
O Lobo de Wall Street parte das memórias de Jordan Belford, um artista que sobe de medíocre vendedor de bugigangas a patrão multimilionário de uma corretora responsável por IPOs, graças à capacidade para vigarizar néscios a quem enfiava ações pelas goelas abaixo como se fossem pílulas para a suprema felicidade. Belford não falha nenhum dos mandamentos da arte da intrujice, começando por uma escolha sensata das vítimas (ricos e ignorantes), passando por um trabalho perfeito em termos de promoção (foram vendidas no mercado, como grandes empresas, escolas de judo ou vendedores ambulantes de sapatos), não esquecendo o clássico pump and dump, manigância que consiste em encher as cotações no pós-IPO, até se abrir o apetite da lorparia, para depois despejar a farta-burros colhendo os lucros (a estratégia global pode ser consultada aqui). Nos tempos áureos, a Stratton Oakmont, liderada por Belford, tinha mais de 1000 corretores de bolsa e o dinheiro jorrava ao mesmo ritmo a que se sucediam os excessos que o livro relata em pormenor, mas que o filme apresenta de uma forma bem mais hilariante.
O livro lê-se com um certo nó na garganta e até alguma indignação moral (li-o em 2009, em versão brasileira, depois de ter sido recomendado no Expresso pelo Nicolau Santos, que o apresentou para ilustrar por que motivo faliu o Lehman Brothers e estávamos mergulhados numa crise de proporções épicas).
Já o filme é uma barrigada de riso como não houve outra em época recente, muito à custa do excelente trabalho de representação do Leonardo DiCaprio, que compõe um Belford tão excêntrico quanto o original gostaria de ter sido, e ao savoir faire de Martin Scorsese por detrás das câmaras, garantindo uma composição final de grande nível, que suplanta o livro por vários níveis de valor.
Louca a cena em que Matthew McConaughey introduz DiCaprio na arte da corretagem vampira (keep the clients on the fair and there it goes: the party is open 24/7 365, every decade, every God damm century. That's it!), ou a da contratação dos anões para praticar tiro ao alvo (Jonah Hill não compromete e assessora DiCaprio com mão certeira), ou o episódio do afundanço do iate (do filme não consta, mas no livro ficamos a saber que Belford afundou o iate porque chegou à conclusão de que ter um barco era uma bodega sem fim e mais valia acabar com o pesadelo de vez - por que não viver a emoção de um naufrágio?) ou aquela em que, quase no final, um Belford inundado de quaaludes desmantela um Lamborghini!
O Lobo de Wall Street foi o melhor filme que vimos este ano (e não vimos nada poucos), não por tocar ao de leve na temática que nos move nesta casa, mas pela superior montagem de uma história, que pega num livro biográfico que, aparte a excenticidade dos acontecimentos que relata, nada tem de especial (o livro encontra-se num pouco vistoso 111º lugar num top de leituras N€B, que este ano registou a 400ª entrada) e a transforma num acontecimento de 180 minutos em que o cinema assume de facto a arte de entretenimento por excelência!
Nos prémios que a academia distribui à la carte (chamam-lhes Óscares) o Lobo não ganhou nem o prémio para melhor filme (levou-o um banalérrimo filme de escravos), nem para melhor realizador (Cuarón por Gravidade - confundiram realização com montagem. Oh God!), nem o de melhor ator (foi para o McConaughey por ter a fineza de mostrar ao pessoal como se pode emagrecer até ao osso). Factos que só tornam o filme do Scorsese melhor! A última vez que eu fiquei acordado toda a noite para ver a cerimónia dos Óscares era um jovem chavalo inocente, há vinte anos atrás, e levou-me um tempo dos diabos a conseguir perceber como é que o Pulp Fiction perdeu tudo para uma cagada de que ninguém se lembra chamada Forrest Gump com o Tom Hanks a fazer de lucky retarded. Depois lá me conformei e segui em frente com a consciência de que os galhardetes que aqueles loucos excêntricos distribuem entre si não passam de estátuas decorativas.
Quando inauguramos esta casa, em finais de abril, já o PSI20 vinha devagarinho a resvalar do máximo do ano feito a 2 do mesmo mês nos 7790 pontos.
Uma das nossas primeiras rubricas viu a luz sob a forma de um conjunto de factos a que demos o nome de "o que devo saber antes de negociar em bolsa" e, se bem que na altura parecessem um pouco extemporâneos quando nos propunhamos negociar num dos melhores índices do mundo (o PSI20 estava a subir mais de 10% no ano e parecia fácil ganhar dinheiro), nos meses que se seguiram fizeram tanto sentido que foi uma pena que não os tivessem lido.
Entretanto, veio maio e nunca fez tanto sentido o célebre dito bolsista sell in may and fly away (far away, I say)! Os da troika foram-se e percebeu-se que o mercado tinha antecipado a saída como uma vitória gloriosa, mas o sell on the news ía-nos custar tão caro que só com muito pessimismo o poderíamos prever.
O BES aumentou o capital e o BCP fez o mesmo! Muita porradinha demos num e noutro AC porque o negócio parecia tão mau como efetivamente veio a ser, mas a verdade é que durante as operações o mercado deu mostras de acreditar que o BCP podia valer 7000 milhões de euros ou que o BES podia valorizar mesmo depois de torrar 5000 milhões em Angola.
No dia 24 de junho escrevemos:
"Deixamo-vos o gráfico do PSI20 que está em zona de vai ou racha. Ou
aguenta o suporte aqui nos 6800-6900 ou vamos ter o caldo entornado pelo
menos até aos 6400 e aí vai-se jogar não só o futuro do PSI, mas também
o futuro da nossa economia. Uma quebra consistente dos 6400 é Bear
Market, o que significa que os mercados sabem coisas feias agora que nós
só saberemos daqui por algum tempo."
E as coisas feias começaram a saber-se 3 dias mais tarde. No dia 27, a PT lamenta-se de ter dinheiro emprestado ao GES. Nós escrevemos:
"Porque é que a notícia lançada para os jornais de que a PT tem 900
milhões de euros empatados no BES está a causar uma mossa tão grande,
tanto no próprio banco como na operadora?
Por um motivo muito simples: porque a PT está com medo de não reaver o
dinheiro! Em condições normais, ninguém dá conta na praça pública dos
investimentos que faz e de quando é que esses investimentos (se se
tratarem de empréstimos) vencem! Mas a sensação que está a correr no
mercado é que estas não são, de todo, condições normais e o facto de a
PT ter posto a boca no trombone conduz diretamente à conclusão de que há
risco de falência de empresas ligadas ao BES. E se isso acontecer, meus
temerários amigos, vai fazer com que o BPN ou o BPP passem por furtos
de delito comum.
E temo bem que esteja finalmente revelada a causa da tremenda anemia que
tem atacado o PSI20 desde maio. Há risco real de desmoronar do BES e
isso implica risco muito sério para Portugal (eu não sei se tem alguma
coisa que ver, mas a verdade é que os juros das obrigações do tesouro
estão hoje em forte alta e eu desconfio que não é só por causa do
défice).
O PSI20 deveria ter reagido muito melhor à linha de tendência que traçamos e principalmente à EMA200 (ver gráfico em post
mais abaixo). Não o fez e hoje pode-se escangalhar todo. Agarrem-se
bem, tomem providências, entrem curto, vão de férias ou aproveitem a
nossa agenda cultural. Mas também é possível que não seja nada!"
O gráfico, visto agora da frente para trás, é este:
Nesse dia, o BES abriu a 80 cêntimos para fechar 10% abaixo, ao passo que a PT caiu 5% a partir dos 2,87€. Na semana seguinte, o PSI20 quebrou a média móvel de 200 dias e esfrangalhou-se!
Se lerem os posts de julho vão notar que, apesar da descrença que se vai apoderando de quem crê na subida, mantém-se uma certa tensão criada pela aproximação de suportes importantes e pelos bons números aparentes que parecem provir da economia real. Mas a Bolsa é feita de empresas velhas que passaram pelos anos dourados do crédito fácil e que, por isso, não escaparam aos excessos que verdadeiramente começaram a pagar neste ano da graça de 2014!
No dia 27 de julho, andava o Carlos Costa do BdP a garantir que havia gente disposta a acudir ao BES e que tudo estava sob controlo, nós escrevemos:
"Prejuízos da ordem dos mil milhões e um aumento de capital até 2000
milhões julgo que estarão mais ou menos descontados pelo mercado. Não
vai ser pílula fácil de engolir, mas a bolsa tem a vantagem de os preços
se ajustarem tão magnificamente, que haverá por certo interessados em
acudir ao peditório. Mas eu na sexta-feira vi a passar em rodapé na
televisão, como se não fosse nada de especial, notícia de que há quem
ache que o BES pode vir a precisar de 4000 milhões de euros. Se for
verdade, bye, bye!"
O BES cotava a 46 cêntimos.
No dia 30, o Expresso diário noticia que o prejuízo será superior a 3000 milhões. Adiós, amigo!
Os meses que nos trouxeram até aqui foram o suceder mais do que expectável de quebra de suportes e ressaltos mínimos típicos de um índice dominado por ursos!
Se queremos negociar em bolsa, temos que compreender que os erros fazem parte do processo e que estaremos permanentemente expostos a eles. Estamos firmemente convencidos de que quem ganha dinheiro de forma consistente falha mais vezes do que acerta: quem perde dinheiro não falha, porque não assume erros, e espera que o tempo corrija as asneiradas que vai fazendo! Não são, portanto, os erros que nos fazem mossa. O que nos cria verdadeiramente problemas é não pensar com a nossa própria cabeça, identificando os momentos chave, e decidindo sem contemplações!
Em 8 meses de atividade N€B, o PSI20 perdeu 33,5%. Quem perdeu dinheiro, pagou o curso, e os que chegam ao fim do ano a lucrar, sabem que isso aconteceu porque cortaram as perdas de forma implacável. No final, que estejamos todos prontos para retomar o combate já para a semana de modo a prepararmos um 2015 que se quer mais taurino!
Para início de conversa, não está mal! Música maestro!
Agora verificamos que aos temas de domingo passado havia que acrescentar um outro, vindo da Rússia, que só se materializou verdadeiramente na segunda-feira. Foi erro de previsão nosso, mas não teve importância de maior a não ser no facto de nos atrasar o ressalto em um dia. Na terça-feira lá fomos para cima, porque se esgotaram de momento as novidades negativas. É evidente que:
a queda do petróleo em voo picado continua a ser uma preocupação no campo geopolítico e uma incógnita do ponto de vista da economia global, mas deixou da haver o susto do impacto inicial;
a perspetiva de eleições legislativas antecipadas na Grécia, com possível vitória do Syriza, continua em cima da mesa, mas já se percebeu que antes do dia 29, data da 3ª ronda das presidenciais, nem vale a pena preocuparmo-nos com esse assunto;
um incumprimento russo vai ter consequências sérias, mas de nada nos vale desatar a vender desalmadamente quando essa hipótese até pode levar o BCE a ser mais agressivo e quiçá contar com a benção do Bundersbank.
Deixo-vos uma cantiga para que possam digerir melhor o que por aí vem (faz parte da banda sonora deste texto):
Não nos vamos pôr para aqui a dissertar sobre as dores de cabeça do Vladimir, mas a cena russa recordou-nos, por vias travessas, do que é verdadeiramente importante para que possamos negociar em bolsa com classe e sem que estejamos sempre na fio da navalha e prontos a desistir. O ingrediente mais importante é, evidentemente, confiança. Confiança em nós próprios, nas nossas capacidades de avaliação e no nosso conhecimento do mundo:
A confiança em nós próprios vem-nos da auto-estima que deve ser cultivada como se faz numa relação amorosa, com pequenos mimos e muito jogo de cintura;
A confiança nas nossas capacidades de avaliação provém da rapidez com que somos capazes de assumir erros sem complacências nem estados de alma;
A confiança no nosso conhecimento do mundo só pode provir de duas fontes: de viajar e de ler. Só há estas duas e não acreditem em quem vos disser que há outras hipóteses para conhecer o mundo!
Sobre viajar nada vos diremos porque trata-se essencialmente de um problema de alocação de recursos em que não metemos bedelho, mas sobre leitura já nos permitimos opinar.
Anda sempre tudo à procura de livros sobre Bolsa e os escaparates vão estando fornecidos de oferta capaz de pôr o mais inepto a pensar em tornar-se num ás dos mercados enquanto lê um livro na retrete. Não vão na conversa! Os livros sobre Bolsa são uma bodega das antigas e não passam de manuais de auto-ajuda feitos para os autores sacarem uns cobres que entregarão nos mercados a quem não lê os livros deles. É uma pescadinha de rabo na boca e se entrarem na dança acabam por ficar com cérebro feito numa papa completamente inútil para negociar! Bem entendido, livros sobre Bolsa é coisa que não existe, da mesma forma que ninguém vai ler livros sobre futebol para aprender a jogar à bola.
OST:
Se são bons a negociar em bolsa vão gostar de saber que poderão ser muito melhores se lerem os clássicos russos (se são maus, já sabem o que hão de pedir ao menino Jesus).
A alma russa é feita de uma inteligência arguta dissolvida num fornecimento ininterrupto de vodka e às vezes metanol. O russo de que nos fala Tolstói ou Dostoiévski reconhece a complexidade da mente humana e estuda-a em detalhe até ser capaz de lhe extrair a essência para ser analisada com a ajuda de um espectrofotómetro. Evidentemente, nada consegue, porque a mente é tão complexa que nem deus atina em a descodificar. Na maior parte das vezes, o pobre diabo suicida-se ou entrega-se à polícia para que na cadeia se possa acalmar (veja-se o que acontece com o Raskólnikov do Crime e castigo). Desses perigos apercebemo-nos nós, os portugueses, há muito tempo atrás, e por esse motivo mandamos a racionalidade às urtigas e tornamo-nos puramente emocionais. Preferimos orar a ler ou viajar. Se fizemos bem, é coisa que ainda se está para descobrir, mas é já certo que há muito a aprender com o processo russo de desmantelar a mente para melhor a entender! E é aqui que, a título de exemplo, o Guerra e Paz ou Os irmãos Karamazov nos podem fornecer boas ferramentas para melhor manobrar nos mercados financeiros.
A Bolsa como mind game é disso que se trata afinal e não há maneira de se lutar no mercado apenas com dados económicos e gráficos, a não ser, claro, que tenhamos nascido com os genes certos. Para os outros, a Bolsa esconde segredos que não é fácil desvendar se não formos leitores escrupulosos (orar pode surtir efeito se soubermos a quem endereçar a nossa súplica, mas costuma ser mais fácil acertar às cegas numa compra ou venda). Para além de se ser capaz de aceitar, como inevitáveis, perdas de dinheiro, a leitura dos clássicos russos (entre outros, bem entendido) é condição de partida para que comecemos a faturar nos mercados. Claro que muitos de vós argumentarão e com razão que nem sabem quem é Tchekhov e mesmo assim tiram 30% limpos ao ano dos mercados! Correto! O meu ponto é que com os clássicos lidos iam aos 100% ou aos duzentos e não tinham noites mal dormidas! Xeque-mate!
São dois os grandes temas do momento: o petróleo e a Grécia.
A cotação dos futuros do petróleo andou toda a semana em modo panic sell e não houve suporte que resistisse à avalanche de vendedores. A coisa foi de tal ordem que o fecho semanal se deu ao valor mais baixo em 11 anos e viemos assentar numa zona em que é bom estarmos sempre a contar com ressaltos violentos, ainda que estejamos a falar de valores velhos com mais de uma década. Na realidade, perto dos valores atuais há a zona dos 54,5 dólares que serviu de mola entre 2002 e 2003 e é tudo! Seja como for, a descida é tão agreste que mesmo os mais temerários defensores da subida do custo da energia já devem ter percebido que os preços baixos estarão para ficar por anos.
Não é difícil concluir que os barris têm feito a alegria dos curtos e a festa parece longe de ter terminado, ainda que se recomende cautela porque uma queda tão a pique costuma dar direito a short squeeze.
Quanto à Grécia temos a primeira ronda da eleição presidencial na quarta-feira e o assunto pode ficar resolvido se o parlamento conseguir acertar uma escolha. Mas os gregos costumam gostar de um certo suspense, pelo que antes da terceira jornada não deve haver fumo branco. Seja como for, os mercados parecem ter descontado por antecipação o pior cenário possível e é provável que algures entre o final de segunda-feira e a sessão de terça haja um alívio a antecipar uma possível resolução do problema.
O Dax e o S&P aproximam-se rapidamente de zonas de suporte e, se levarmos em linha de conta o facto de serem índices que vêm de máximos históricos, é capaz de haver motivos válidos para um ressalto de curto prazo, quiçá a preparar um reteste a máximos nas primeiras semanas de janeiro. Se o crude ressaltar e a Grécia der sinais de evitar eleições legislativas é possível que voltemos para cima ainda mais cedo.
Como os dois índices vêm de subidas violentas acrescentamos aos gráficos as retrações de Fibonacci que costumam dar boas indicações quanto a pontos de suporte e de possível inversão de tendência.
Estamos, pois, em crer que algures num destes valores de retração, na Lta no S&P ou na linha de suporte horizontal do DAX vai estar o ponto de ressalto a máximos. Que assim seja!
Quando a Bolsa cai há sempre a tentação de apanhar o fundo do movimento para fazermos o negócio das nossas vidas. Na prática, a arte é equivalente à do artista que apanha canivetes quando eles chovem. Na maior parte das vezes acabamos a ter que fugir para os abrigos em marcha forçada, mas de vez em quando lá calha ficarmos com uns lotes a bom preço, o que nos dá a satisfação bestial de durante algum tempo nos considerarmos a nós próprios os indíviduos com mais cagança da Bolsa inteira. Não é uma arte fácil e comporta riscos de monta, mas tentar não custa quando se pouparam os cobres de ter ficado de fora a ver o preço a vir por aí abaixo. E a vantagem de se comprar nos suportes é que não precisamos que nos façam um desenho para saber quando é altura de passar a pasta a outros mais afoitos. Se é que me entendem. ;))
No PSI20 podemos estar a toques de ter um desses momentos em que a arte de apanhar canivetes se pode justificar por motivos técnicos. Amanhã podemos fazer um duplo fundo, ocorrência que não costuma passar despercebida aos que se mantiveram sensatamente de fora a ver o ataque ursino e a salivar por uma compra em saldos. Ora vejam:
De acordo com as regras, o duplo fundo só é verdadeiramente ativado com a quebra do máximo relativo que se encontra de premeio e tem projeção igual à diferença fundo-máximo. Neste caso, será de admitir que apareçam caçadores de duplos fundos na aproximação à zona dos 4900 pontos, pois a ativação da figura projetará o índice para os 5600-5700 pontos, coisa de 14% acima, o que, nos tempos que correm, é um ganho catita.
A quebra dos 4900 pontos em fecho é sinal para bater em retirada, pois podemos com toda a tranquilidade esbardalhar mais 9% até aos 4450:
Quem não gostar de confusões nem de se sentir apertado é favor abster-se!
Se há ensinamento que qualquer trader adquire à força com a passagem
do tempo é que na Bolsa sai muito caro tentarmos antecipar quebras de resistências.
Vejam o que se está a passar no PSI20. Temos tido momentos de subida
esporádicos em alguns títulos e quem está nos mercados diariamente vai tendo
oportunidade de tentar ganhar dinheiro aqui e ali, mas a verdade é que, a menos
que sejam bastante disciplinados, é muito difícil ser consistente. Há coisa de
duas semanas tivemos o índice perto de quebrar a primeira resistência nos 5350
pontos, e referimo-nos aqui a esse facto, mas falhou o sinal que marcamos como
indispensável, pelo que qualquer entrada seria extemporânea. De facto, é muito
mais seguro comprar mais caro numa quebra robusta dos 5350 ou até dos 5400
pontos do que tentar ganhar mais uns cobres e arriscar antes de tempo
(recorde-se que, na nossa leitura, o bull market apenas regressa na quebra em
força dos 6400 pontos! Quando será? Quando ninguém o esperar!). É a esta
dificuldade em quebrar resistências que se chama bear market e a verdade é que um
mercado dominado por ursos bota abaixo pode durar um tempo verdadeiramente
exasperante e atirar para fora de jogo o mais intrépido dos investidores.
Enquanto o bear market durar a nossa principal missão é preservar o capital,
cortando perdas de forma absolutamente radical, e apenas entrando cirurgicamente
quando o rácio risco/perda for francamente favorável. Notem que não é fácil de
fazer e só se recomenda a quem não tenha amor ao dinheiro e durma bem de noite com
a carteira em sobressalto. Há um velho dito bolsista que diz que a melhor
maneira de conseguir 1 milhão de euros em bear market é começar com 2 milhões.
Não é exagero para 95% dos traders!
E por que motivo caem agora as bolsas quando tudo parecia
apontar para um dezembro de qualidade?
Os americanos corrigem em larga medida por motivos técnicos.
A segunda tentativa de passagem acima do canal ascendente deu para torto e a
correção tornou-se óbvia (continua válida uma análise que fizemos há dias para o S&P500). Claro que os especialistas apontam a queda da cotação
do crude, que, diz-se, prejudica os ianques pois passaram de consumidores
a produtores nos últimos anos. É verdade que se trata de um motivo válido: na
América criou-se na última década e meia toda uma indústria à volta da extração
de gás e petróleo do xisto, que se tornou subitamente menos rentável com todas
as consequências que daí advêm para o investimento e o emprego. Mas também não
deixa de ser verdade que os EUA ainda são importadores líquidos de petróleo
pelo que parece haver, apesar de tudo, um ganho na queda do preço do barril. É
possível que venhamos a verificar nos próximos dados económicos que o balanço
ganho/perdas da queda do preço do petróleo está efetivamente a ser negativo,
mas até agora a queda ocorre porque há mais gente a achar que é tempo de
realizar mais-valias.
A situação europeia é diferente. A Europa enfrenta no
próximo ano um desafio muito grande com eleições em diversos países, entre os
quais Portugal e Espanha. É neste último país que o cenário eleitoral parece
ser bastante preocupante com a ascensão do Podemos a criar desconfiança
relativamente ao resultado mais ou menos inovador que poderá sair das urnas. As
declarações dos dirigentes do movimento dão a entender de que não ficará pedra
sobre pedra no edifício económico-social caso saiam vencedores, pelo que mais
do que discutir se se vai para melhor ou para pior, é a incerteza que falará
mais alto. E a incerteza é uma grande companheira dos ursos dos mercados. Este
cenário estava no horizonte para meados de 2015, pelo que era encarado como
longínquo (antes ainda teríamos o QE do BCE), mas ontem ficou subitamente mais
perto com a decisão do governo grego de antecipar as eleições presidenciais no
país. É que há a possibilidade de as presidenciais despoletarem eleições
legislativas e quem aparece à frente nas sondagens é o Syriza. Não é difícil
perceber que a subida do Syriza ao poder na Grécia vai voltar a trazer os
gregos para a ribalta, mas, mais do que isso, vai tornar mais provável aos
olhos dos mercados a ascensão do Podemos em Espanha. Se isto é apenas uma
correção natural ou um movimento de fundo é algo que estamos para saber, mas
parece que vamos voltar a ter os mercados a reagir ao ritmo das sondagens, e um
panorama que a prazo é tão incerto que pode haver motivo
para ficarmos assustados.
No intervalo entre negociatas deixo-vos os James ao vivo na estação de S. Bento. Os James fazem parte da história da minha vida musical e muitas vezes os pus a tocar na rádio em que trabalhei durante algum tempo. Agora, estão um bocado datados e o Tim Booth adquiriu o ar tiquento de vedeta bichada, mas é impossível apagar o passado e a música que ouvimos quando somos adolescentes fica connosco para sempre. That's the living!
Olhando para o PSI20 fica-se com a ideia de que Portugal é um país rico em matérias-primas e um grande produtor mundial de petróleo. Esses são os grandes prejudicados pela era da energia barata em que aparentemente estamos a entrar e não admira que estejam a passar um mau bocado! Quando já ninguém liga ao facto de as empresas portuguesas virem a beneficiar na fatura energética e nos custos de financiamento, e o índice continua a afundar, percebemos que o país está ainda mais escangalhado do que nos têm dado a ver! E isto já não tem só que ver com o nosso dramático bear market.
Quantos países no mundo têm um ex-primeiro-ministro preso por suspeitas de corrupção? Eu sempre achei que havia corrupção em Portugal como em qualquer outra parte do mundo, mas a nossa inocência leva-nos a pensar que os governantes de topo não se metem nisso porque são demasiado escrutinados. Quando finalmente percebemos que até esses tiveram o arrojo de levantar suspeitas, diabo, isto está tudo tão podre que o melhor seria fazer reset e começar de novo! Como é que um país que lutou tão arduamente para ser independente perdeu a independência de uma forma tão aporcalhada? Que gente é esta que teve o desplante de nos dar cabo do país desta forma?