6.7.14

A semana que termina e a que agora começa

Num mercado claramente ascendente é fácil ganhar dinheiro na Bolsa (mais difícil é maximizar o lucro e bater o mercado), e num mercado descendente, com más notícias e quebras de suportes sucessivas é fácil evitar entalanços (basta vender, assumir pequenas perdas e preservar o capital, evitando ao máximo cair na esparrela do "a longo prazo tudo acaba por subir"!).

São estes tempos de grande indefinição que vivemos desde inícios de maio no PSI20, com medo não se sabe bem de quê e uma tendência descendente cheia de ressaltos, que vai destoando do que se passa nos mercados financeiros mais populares, que constituem o pior veneno que existe para o investidor mais experiente. É que as sucessivas quebras de suportes levam à ativação de sinais de venda que são postos em causa logo de seguida com sinais de compra que, por sua vez, também acabam por se revelar falsos. De maneira que o investidor, que apenas pretende minimizar riscos para a carteira, atuando de forma mais ou menos racional, vendendo e comprando de acordo com os sinais habituais, corre o risco de acumular perdas que, ainda que pequenas, acabam por ser em número tal que podem fazer mossa. Tradicionalmente, são estas épocas em que, de facto, se correm os maiores riscos. O sensato será sempre abandonar o mercado nestas alturas de lateralização e esperar por sinais evidentes de desiderato. Claro que, na prática, é sempre muito difícil a quem tem um streamer (esse casino doméstico!) resistir às aparentes pechinchas que vão aparecendo. Seja como for, é sempre duvidoso que os lucros acabem por pagar as chatices de andarmos metidos num mercado que está permanentemente a ameaçar dar cabo de nós, principalmente quando sabemos que podemos retirar lucros maiores com menos chatices se soubermos ser pacientes.

Na segunda metade da semana que passou acabou por vir ao de cima uma certa lógica no PSI20. Aliás, a única coisa que não veio ao de cima foi o próprio índice que continua a ameaçar ir parar a terreno negativo no ano e testar o suporte dos 6300-6400 pontos (que belo ponto de entrada esse seria!). Para nós, que costumamos usar médias móveis nas nossas análises, chamou-nos a atenção o facto de o índice acabar a semana cerca de 40 pontos abaixo da SMA200 (simple moving average de 200 dias), sendo que essa quebra acontece pela primeira vez em um ano. A quebra da média móvel de 200 dias, pela própria definição do indicador, é um acontecimento relativamente raro e que costuma produzir sinais bastante relevantes, tanto num como no outro sentido. Na figura seguinte, colocamos um gráfico de longo prazo do PSI20, em que a linha vermelha representa precisamente a SMA200. Assinalamos com uma faísca amarela as vezes em que a quebra em baixa da linha curto-circuitou carteiras e torrou mais-valias. Há umas elipses verduscas que representam quebras benignas:


Reparem como é evidente o forte sinal de venda que costuma resultar de uma quebra em baixa desta média móvel (e, já agora, do sinal de compra que resulta de um rompimento em sentido inverso). 

Agora deixamos o mesmo gráfico mas para o prazo de um ano:


Há precisamente um ano ocorreu a última quebra em baixa de SMA200, fruto como se recordarão dos arrufos dos nossos governantes. Na altura, o índice manteve-se abaixo da média móvel apenas mês e meio, tendo uma queda máxima de 7% (se retirarmos a ilha de inversão no dia 3 de julho de 2013). Curiosamente, essa queda máxima neste momento, colocaria o PSI20 precisamente na zona de suporte em torno dos 6350 pontos. Evidentemente, podemos estar em presença de simples coincidências, até porque a história nunca se repete exatamente da mesma forma e também é verdade que costumam ocorrer alguns falsos sinais e dar-se o caso de já na próxima semana recuperarmos o pé. De qualquer das formas, queríamos que ficassem com esta ideia para que possam entender melhor por que motivo podemos assistir a um acelerar da queda caso se confirme a quebra da SMA200. E essa aceleração vai suceder independentemente das notícias serem boas ou más e de os outros índices subirem ou descerem. Bastará que a maioria dos investidores conclua que há uma quebra real de um indicador de longo prazo como este é. Por outro lado, também é verdade que esta importância que a quebra da SMA200 tem lhe confere uma força bastante grande enquanto suporte, pelo que é perfeitamente possível que o fecho de sexta-feira seja um falso break e o índice encete uma subida a partir daqui. Estamos perante, pois, mais um ponto exemplo das tais decisões difíceis que se apresentam aos investidores em mercados laterais como é o português neste momento.

Duas palavras finais para dois títulos de que aqui falamos ao meio da semana e que andaram nas bocas dos investidores nos últimos tempos (aliás, cremos que a atenção excessiva dada a estas ações está a distrair-nos de outras oportunidades que vão aparecendo noutros títulos).

Comecemos pelo BES. Numa das últimas análises que fizemos recomendamos uma entrada na zona dos 0,65€. Claro que um suporte tão importante é sempre um bom ponto de entrada, mas também é um ponto que, em caso de quebra, espoleta um exacerbar das descidas. E isso aconteceu efetivamente, criando um movimento típico de panic sell. Para quem aguentou a bucha, a coisa já está a recompensar porque, lá está, acabaram por vir as boas notícias que tornaram o ambiente menos negro. A equipa de gestão escolhida para o BES tem, de facto, credenciais e, ainda por cima, está muito encostada ao Governo o que, parecendo que não, dá sempre jeito. Até onde pode ir o BES? Respondo-vos com toda a franqueza: eu gostava de vender na zona dos 0,83€ (mas não sou esquisito), que é onde se situa a EMA21, porque não acredito que no médio prazo haja qualquer inversão nos problemas que andam a afligir o BES e estou em crer que a notícia do desamparo da loja pelos Salgados é eminentemente de curto prazo. 

E o BCP. Bom, do BCP há a dizer que fez aquilo que se previa, que foi esvaziar um bocado aquela euforia inicial, que nos surpreendeu (como já confessamos) e nos fez ficar a salivar tal o lucro que se poderia ter feito. Agora, depois de uma queda de 18% nas ações e de 24% nos direitos só na sexta-feira (face ao valor teórico de quinta-feira) é possível começar a pensar numa entrada.

Na figura seguinte, colocamos o gráfico já ajustado do AC. Verificamos que na sexta-feira a EMA21 (exponential moving average de 21 dias, a amarelo) travou a cotação, tal como seria de esperar. Se juntarmos à presença da média móvel a resistência que assinalamos a preto na zona dos 0,111€, ficamos com a ideia de que se pode tratar de um bom ponto de entrada. 



A chatice é que o BCP está neste momento numa situação especial, em que paralelamente às ações temos a negociação dos direitos. Hoje os direitos estão a dar um prémio de menos de 4% relativamente às ações (com os direitos ficam com ações a 0,1107€), o que é manifestamente pouco tendo em conta o facto de as ações do AC só poderem ser negociadas no final do mês ao mesmo tempo que entram no mercado 35 mil milhões de uma só vez! Esqueçam os direitos! A estes preços, ou os direitos descem, ou as ações sobem, porque ninguém é maluco ao ponto de se contentar com 4% tendo de esperar pelo dia 28 de julho (ou será que é?)! A minha ideia é que os direitos vão ter que descer mais um bom bocado e isso, evidentemente, arrastará as ações, pois o prémio também não vai exorbitar. Creio que um prémio de 6 ou 7% é capaz de se revelar justo. O problema é perceber a quantidade de direitos que serão despejados no mercado. Façamos um exercício de aritmética (a minha vida está carregada de matemática e de física e é evidente que não me importo nada de fazer contas, mesmo que depois elas se venham a revelar totalmente especulativas):
  • Se os direitos vierem ao mínimo de sexta-feira, 0,077€, devemos ter uma variação mínima nas ações;
  • Para que possamos comprar as ações ao preço de 0,111€ que "recomendamos" é preciso ter os direitos a 7 cêntimos (uma queda de 12,5% face a sexta-feira), tendo em conta um prémio de 6%;
  • Se houver uma hecatombe nos direitos e eles vierem 37,5% para baixo até à zona dos 5 cêntimos, vão ver as ações a passar de mãos, com prémio de 6%, a dez cêntimos a unidade.
Claro que amanhã podemos ter já uma inversão completa da tendência, com os direitos a subirem e a arrastarem as ações, mas a olho nu acredito mais numa pressão sobre os direitos que nos possa proporcionar finalmente um bom negócio no BCP.

Já agora, embora o texto já vá longo e estejamos cheios de medo de estar a abusar da vossa paciência, deixem-me dar aqui uma achega do ponto de vista fundamental. 

À cotação atual, o BCP está avaliado em 6268 milhões de euros. Não é barato, mas se compararmos com os mais de 7600 milhões de há 3 dias atrás o caso começa a mudar um pouco de figura. Para além disso, se lhe deitarem a mão a 0,111€, vão comprá-lo a um preço equivalente aos 0,192€ antes do AC (se lhe somarmos os 2250 milhões que o banco vai buscar ao bolso dos investidores). E a verdade é que com o dinheiro do AC em caixa o BCP está melhor que sem ele (se vai criar valor com esse dinheiro, já é outra história). E notem que nem se falava em AC e o BCP foi aos 0,23€. Para além disso, daqui a pouco vamos ter resultados do 2º trimestre e não me custa nada acreditar que possamos ter gente a falar em lucros. De maneira que o negócio nestes termos já parece ter ponta por onde se lhe pegue. Por outro lado, não estamos livres de virem por aí abaixo, da parte do Millenium, notícias salgadas como as que o BES e a PT vomitaram cá para fora. Se assim for, lá se vai quanto Maria fiou!

Mais por vós... não podemos fazer! Boa semana e bons negócios.



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