8.4.17

O texto primevo, algures no Inverno recente.

Esta espécie de apêndice que trazem colado a um dos lados cerebrais é, inusitadamente, a primeira marca visível dos seres biónicos que já são: germinam em cada lugar, anódinos, passando ao de leve pela vida.

             Não lhes interessa o peso-pluma dos pardais saltitando à sua frente, pululantes e bicando o solo dos dias, a brisa nos ramos secos no mais belo Inverno de sempre - por ser o de agora -, os precoces odores a comida desta meia-manhã citadina. Há, pois, movimento, ar e alimento. No caso do primeiro e do último exemplos, a sua falta seria notada após, no máximo, algumas horas; o caso central, o do ar, seria imediatamente notado, a par com a falta do tal apêndice colado na parte exterior do cérebro e enviando-nos informação a ritmo pluridiário.
               Há algo de sabor metálico - como quando se estanca na boca o fluxo saindo de dedo cortado há segundos - nesta acepção: se o ar faltasse/se o aparelho faltasse, o efeito seria imediato. Equiparam-se, aqui, duas formas de respiração: a de cada humano/a do planeta, que não sabe, já, de si, sem a comunicação permanente.
              Daqui a uns meros dez anos, mais não seremos do que seres semi-curvados, semi-surdos, semi-vazios de olhares sobre os pardais, do efeito na pele sob a brisa, de cheiro dos alimentos. Há qualquer coisa de sabor a cinza, nesta ausência de coisas vivas, descartando-se os sons da vida real que nos submerge, alheados que andamos no desespero de saber sempre novas coisas. E do que a cada dia temos como absoluta garantia, temos sabido saboreá-lo como o novo que de facto é, a cada novo dígito que o calendário nos dá?...

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