17.6.15

Aristófanes e Tsipras (o paflagónio)


Antes de começar a opinar sobre o assunto mais falado do momento, um dado que foi tornado oficial na semana passada: na zona euro foi entre gregos que o PIB mais subiu e mais desceu no primeiro trimestre. Chipre e Grécia encabeçam e fecham o pelotão do euro. Dá muito que pensar isto sobre a eficácia dos planos do FMI e de como falham num sítio e são eficazes noutro, mas uma conclusão óbvia é a de que a situação que se vive não tem nada a ver com as pessoas em particular, mas sim com políticos, políticas, corrupção entre outros.

O jogo do medo de Tsipras começa a não dar certo entre os parceiros europeus, e então a estratégia para dar a volta à situação passa por … meter mais medo ainda. Ameaçam toda a Europa com o Apocalipse, como se, saindo do euro, este se desmoronasse. E tanto medo metem (e aí a estratégia está a funcionar) que as pessoas andam de olhos no ar e fazem contas com os dedos, a tentar adivinhar se de facto nos espera um ruir de todo o projeto europeu, como se fosse um castelo de cartas. E estes políticos extraordinários que têm mantido entretidos os europeus há já vários meses como se tem comportado a governar o seu país? A Grécia foi o único país da zona euro com crescimento negativo no primeiro trimestre. Bravo Tsipras!! Bravo Varoufakis!!! Mais palavras para quê?

Mas será fundado o medo que nos tentam incutir? Será que o euro está condenado a acabar e a União Europeia a desmoronar? Será que o caso grego é um imenso Lehman Brothers? Economistas conceituados há-os a defender posições opostas. Mas parece-nos haver uma grande diferença entre as duas situações: o grande problema, com risco sistémico, da última crise foi o terem os créditos associados ao subprime, dando origem a produtos estruturados e espalhados por bancos de todo o mundo (o que é normal acontecer com créditos). Ora a dívida grega está, maioritariamente, nas mãos dos estados do euro e no BCE; o risco sistémico, para lá da poeira que vai levantar ao início, será nenhum. Os estados é que terão que assumir o incumprimento e um défice, a determinada altura, acima do esperado.

Será a posição do BCE e da Comissão Europeia assim tão dura? Vamos colocar a questão de outro modo: porque não hão de ter os guineenses ou os salvadorenhos os ordenados e o nível médio de vida dos portugueses? Ou porque não hão de ter os portugueses os salários dos alemães? Porque os países são diferentes, os seus habitantes têm formações académicas diferentes e produzem diferentemente. Daí o nível médio de vida ser diferente. Óbvio, não é?
Se nós vivemos acima das nossas possibilidades durante uns anos e contraímos uma dívida brutal, os gregos contraíram uma dívida imensamente brutal e viveram muito acima do que lhes permitia a sua economia. Dois resgates (sendo o segundo acompanhado de um haircut à dívida superior ao do resgate a Portugal, num país com 11 milhões de habitantes) e continuam na situação em que estão! Para manter o nível de vida o governo precisaria de outro resgate, seguido de um haircut, e depois outro, e depois outro....

A esplendorosa Grécia Clássica entrou em decadência no final do século V a.C. Embora algumas cidade estado ainda brilhassem no século IV a.C, a decadência foi irreversível, e muito acentuada na principal delas – Atenas. Épocas de decadência costumam dar as boas-vindas a políticos demagogos que não estão muito interessados em resolver os problemas das pessoas. Após a morte de Péricles apareceram alguns, sendo um deles Cléon.

Na Atenas em decadência vivia um (muitos na realidade) homem de génio chamado Aristófanes. Era um comediógrafo (todas as onze comédias que sobreviveram estão traduzidas em português) que no meio dos sucessivos desastres que assolavam Atenas conseguia engendrar enredos brilhantes que colocavam uma estátua a rir. O ambiente político da Atenas da época foi também motivo para escrever uma peça: Os Cavaleiros. Nela, o governante demagogo no poder na altura, Cléon (na peça chama-se o paflagónio), foi ridicularizado por tentar enganar o povo e pretender arrastá-lo ao abismo. O triste foi que, na realidade, Cléon conseguiu e Atenas afundou-se mais do que o que estava antes dele. É o destino inevitável de quem aposta em demagogos, não importa que sejam de extrema direita ou esquerda. Com Tsipras o destino da Grécia está traçado.

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