2.2.17

Queda livre (e descompassada) na arte de desconversar

*
- Tens queda para isto. – Disseram-me, numa voz por entre a música.
Sorri das ironias da vida:
    - Tenho várias quedas no currículo. De algumas não (me) saí tão bem… - mostrei a enorme cicatriz no tornozelo esquerdo. Parafraseando o saudoso António Feio, comprovei os factos com o “documento anexo”: no caso dele, era a enorme calva dos tratamentos; no meu, é a sinuosa costura.
     Sorriem-me, dando aos ombros, sem entender nada:
     - Não, queria dizer… que tens jeito para dançar e isso...
     - Sim, mas nem sempre saio incólume das minhas quedas.
     - Incó… quê?



- Ilesa. Nem sempre saio ilesa.
- I… quê?
- Intacta. Inteira. São sinónimos. Espero sair bem desta “queda” para a dança.
- Desculpa…? Perdi-me.
- Não faz mal. Também já perdi o compasso.
- Como?
- Perdi o compasso. O ritmo. Como perdi o compasso da dança, vou fazer um compasso de espera.
- Hã?
- Vou parar. Posso perder o pé. O outro, o direito. O incólume.
- Ok. Vou dançar, adeus.

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