Na primária organizaram uma
visita de estudo e Ulisses foi a Lisboa. Do passeio pouco sobrou na memória, a
não ser os pesadelos noturnos por causa da Branca
de neve e os sete anões que foram ver ao cinema e a algazarra enorme que
todos fizeram no autocarro quando iam para baixo. Da cidade grande, nada! Mas
aquela viagem a Lisboa foi deveras importante, pois marcou o início da odisseia
de Ulisses pelas capitais.
Quando estava no secundário o
argumento foi avaliar o funcionamento de Almaraz e depois deram uma saltada a
Madrid, e a viagem de finalistas, em vez da praia e da festa do costume, foi um
passeio a Paris de autocarro que os pais aceitaram que todos fizessem. Torre
Eiffel, Louvre, Quartier Latin, etc., em pouquíssimo tempo tinha mais uma
capital no currículo, mas foi só na viagem de regresso, quando todos vinham
murchos do cansaço, que se apercebeu de como já conhecia tanto e, ainda tão
jovem, se podia gabar de já ter estado em três capitais europeias.
Mais tarde notou, não sem choque,
que não era a viagem em si o que mais lhe agradava, mas sim quando depois contava
a experiência por que passara aos que nunca viajavam. Era o máximo descrever
aos familiares aqueles lugares de que todos ouviam falar, mas que apenas conheciam
de ver na televisão, e ele sentia-se importante por ser um moço viajado.
Na Universidade foi de Erasmus
para a Holanda, três meses de pouco estudo e muito dinheiro investido em
comboios e solas de sapatos. Aproveitou e conheceu Amesterdão, Bruxelas,
Berlim, Copenhaga, Luxemburgo, Praga, Viena, Budapeste, Berna, Vaduz,
Ljubljana, Bratislava, Varsóvia, Zagreb e Londres. Conhecer é capaz de ser um
pouco exagerado, porque às vezes mal dava tempo para pôr um pé fora da estação,
entrar num minimercado, traçar uma bucha e um pacote de leite achocolatado,
sentir o ambiente, cheirar o ar e voltar a abalar. Num assomo de loucura
embarcou para Reiquiavique e voltou no dia seguinte, maluco da cabeça por não ter
visto o pôr-do-sol, e com a pele gretada do frio polar para que não ia
preparado. Claro que havia localidades de que era fundamental trazer um
atestado de presença, como daquela vez em que teve de esgalhar da estação até
ao Manneken Pis só para tirar uma foto, ou quando subiu, a deitar os bofes, a
escadaria da Siegessäule para obter uma panorâmica de Berlim. Isso era uma
prova irrefutável de presença, um autorretrato com a landmark em pano de fundo.
to be continued...
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