3.3.18

O apagão (parte final)

Mas isto que vos contei até aqui não é nada de especial quando nos apercebemos da incomunicabilidade. Foi aí que verdadeiramente panicamos todos ao ponto de termos ficado gagos de tanto matutar sobre o assunto. Como devem imaginar, é duro agora ficarmos mergulhados nas trevas negras ou deixarmos de poder saborear uma data de guloseimas absolutamente irrepreensíveis, ou sei lá, passarmos a ter os hospitais num caco, as escolas todas espatifadas ou termos de andar permanentemente a pé com solas gastas porque não há gasolina para pôr nos carros, etc., mas ninguém está preparado para que nos venham dizer que não podes usar o telemóvel, nem o computador, ou ir à net, ao face, tipo, postar, e tirar umas selfies todas maradas e LOL da cara de porquinha da fulana de tal, e assim. A verdade é que foi das coisas mais maradas que eu alguma vez ouvi na vida quando me disseram que se não tens luz elétrica os pcs não funcionam e é só uma questão de tempo até as baterias dos telemóveis escafederem geral. Garanto-vos que, ao princípio, nem queria acreditar, quer dizer, é tudo tão surreal que achas que estão mesmo a gozar com a tua cara a ver se cais na asneira de tirares uma selfie com aquele ar todo apalermado, ou coisa do género, mas depois dás-te conta de que é mesmo verdade e o teu telemóvel vai deixar de funcionar para sempre e acabas por te transformar na pessoas mais infeliz do mundo, sei lá, tens vontade de embocar uma garrafa de whisky de uma só vez (como se ainda houvesse whisky à venda, e não fosse necessário luz elétrica para o fazer), ou de fazer de conta que és uma banana, etc.

E, então, falhou tudo e nós ficamos incomunicáveis e foi como se nos tivéssemos teletransportado para uma outra galáxia ou, sei lá, uma coisa assim estranha lá longe num país habitado por vegetais que caminhavam aleatoriamente, tristes como a noite e sem poderem estabelecer uma comunicação por mais rapeta que fosse, pois eram vegetais e não tinham boca nem olhos, quer dizer, nós tínhamos boca e olhos, a luz falhou mas não nos levaram partes do corpo, era o que mais faltava, mas a verdade é que melhor seria se nos tivessem levado a boca (os olhos não que faziam falta para ver as teclas) e deixado cá os telemóveis com baterias infinitas (por que diabo não inventaram baterias infinitas enquanto havia livros é algo que não consigo conceber!) para a gente continuar a enviar sms uns aos outros. Pela parte que me toca, bem que gostava de fazer alguma coisa para poder inverter a situação e pus-me a magicar, magicar e acabei por me lembrar de que podia restabelecer a comunicabilidade se fizesse sinais de fumo como faziam os índios há muito tempo atrás num filme que vi na televisão, mas só depois me dei conta de que para fazer fumo é preciso ter fogo, coisa que infelizmente se nos foi desde que falhou a luz e já não veio.

E foi então, já em desespero de causa, que me lembrei de que podia pegar num lápis (que, felizmente, não é elétrico) e escrever. E escrevi este texto.

To be finished...

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