Quando chegou cá era um homem
feliz: Ulisses o conquistador da América! Fizera o roteiro das capitais em quinze
dias de jornada, mas tinha visto tudo e sobre tudo tinha mais do que
legitimidade para opinar. O Canadá é um assombro, uma terra de cultura e
delícias, as Honduras de cortar à faca e têm sorte se não vos fizerem às postas,
se gostam de praia, não é bom pensarem em ir à Bolívia, e de Buenos Aires a
Montevideu a melhor forma de passar é a nado, através do Río de la Plata, pois
evitam engarrafamentos bastante enfadonhos!
Essa arte de viajar pelo mundo
continuava a ter o seu lado desconfortável e até assustador e, bem vistas as
coisas, antes de sair pensava sempre que ficava bem mais tranquilo e sossegado
em casa, mas depois de meter pés ao caminho só se preocupava em não perder nada
do manancial de conhecimentos a que estaria exposto, e com viver sofregamente as
aventuras infinitas de que depois podia lançar mão numa mesa de conversa.
Quando regressou da América tratou logo de explanar todo o seu poder de fogo
perante os amigos (que os tinha e muitos), mas foi com horror que verificou que
ninguém queria saber de Georgetown ou de Assunção e todos falavam de Havana ou
de Santo Domingo, sítios onde, lamentavelmente, se esquecera de ir! Claro que havia sempre a hipótese de forjar
uma montagem com um retrato enquadrado numa paisagem retirada da net, mas, por
Deus, Cuba é uma ilha cercada de tubarões e nem ele teria o arrojo de enfiar a
patranha de que tinha nadado até lá. Demais a mais, pensava, se não queremos
perder o prestígio que nos deu tanto trabalho a conquistar não podemos correr o
risco de nos apanharem em falta de uma forma tão saloia! Um Cidadão do Mundo tem
que ser, acima de tudo, impecavelmente honesto. Faria um cruzeiro nas Caraíbas
noutra altura.
Entretanto, deu com as redes
sociais e investiu imenso tempo a arregimentar amigos virtuais para colocarem gostos nas fotos que ia publicando.
Criou um blogue onde mandava todo o tipo de larachas sobre viagens, dava
conselhos a quem os pedia e encheu a Internet de fotografias onde aparecia em
locais emblemáticos. Foi-se tornando famoso, o tuga que correu a América em
meia dúzia de dias, um Ulisses homérico dos tempos modernos, um viajante
intrépido e destemido, um migrante temporário e voluntário, uma vítima da
incapacidade do homem para estar quieto, enfim um profundo conhecedor do mundo
e das suas nuances!
to be continued...
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