2.2.18

O nosso estilo (parte 1)

Muita gente tem-nos perguntado por que motivo só investimos na bolsa portuguesa, que deve ser um dos mercados mais desgraçados do mundo, quando temos ao alcance de um clique tudo o que o mundo tem para oferecer no que a investimentos diz respeito. A pergunta é pertinente e tem uma resposta muito simples: porque quando investimos noutras coisas sempre nos demos pior do que estando apenas concentrados cá na paróquia!


Claro que muitos acharão esta conclusão estranha, pois o PSI está pouco acima de mínimos históricos e muito longe de máximos, ao passo que não faltam por esse mundo índices a bater no teto, onde o lucro teria sido muito maior e o risco consideravelmente mais baixo. Será, pois, importante que elaboremos um pouco sobre o assunto. 

A bolsa comporta, evidentemente, imensos riscos, característica em que não difere de tantas e tantas situações da nossa vida. Mas na bolsa há uma perceção muito maior do risco, porque não há a hipótese de nos iludirmos. Quando compramos imobiliário, por exemplo, podemos sempre manter a ilusão de que o nosso produto vale X, mesmo que o nosso vizinho tenha vendido por X/2. O preço está sempre aberto a discussão e, em última instância é sempre possível argumentar, negociar e regatear. Mas na bolsa é o que é, mesmo que nós não compreendamos ou achemos que há alguma espécie de erro!


Além disso, há um sem-número de variáveis muito difíceis de abarcar em conjunto que influenciam o preço dos produtos em bolsa, a começar desde logo por algo tão imprevisível quanto o estado de espírito dos investidores. Como todos sabemos, tão depressa pode estar tudo bem, como rapidamente, sem se saber como nem porquê a coisa descamba e escafede. No fundo, existe uma aleatoriedade que não nos é confortável e obriga a que nos adaptemos muito mais rapidamente às situações do que, em condições normais, gostamos de fazer.

O risco na bolsa não é apenas o de perder dinheiro (diria que isso não é um risco; é uma inevitabilidade), mas é também o risco que advém da possibilidade de podermos tomar decisões ao segundo. Cada segundo é um bom segundo para fazermos asneiras ou para tomarmos decisões acertadas. Em cada segundo podemos comprar antes de uma subida ou vender antes de uma descida, mas também podemos fazer justamente o contrário e isto faz com que possa haver aqui uma componente de jogo que inevitavelmente nos empurrará para fora do mercado! 


Finalmente, existe um risco de sanidade. Alguém dizia que ao lucro é necessário subtrair sempre todo o desgaste que tivemos para o obter e os mercados financeiros são ótimos locais para nunca nos esquecermos destas palavras tão pertinentes. Muita gente trabalha muito e ganha bom dinheiro, mas dá cabo da cabeça e do canastro e acaba por nunca tirar partido do "sucesso" que teve, porque se esqueceu de descontar o que é mais importante descontar. Por outro lado, ser capaz de assumir um erro sem exorbitar ou ir a correr duplicar esse mesmo erro não só está ao alcance de poucos, como é muito difícil de fazer sem causarmos algum tipo de melindre na nossa hipófise.


A receita dos gurus para este estado de coisas passa pela adoção de duas medidas de contenção: diversificação e investimento a longo prazo. 

Ao diversificar "garantimos" que, mesmo que algo corra mal, haverá sempre alguma coisa a correr bem para compensar. Ao investir no longo prazo, contornamos a nossa ignorância acerca do futuro imediato e asseguramos que a estatística joga a nossa favor: em média o mundo tem, evidentemente, progredido, pelo que a longo prazo "tudo" sobe! No fundo, trata-se de seguir a receita de muitos ases dos mercados, sendo o mais famoso de entre eles Warren Buffett cujos livros são manuais de sensatez e as decisões que tomaram constituem exemplos supremos da arte de bem estudar o mercado, fazer escolhas fundamentadas e agir em consonância. No princípio, todos nós temos um pouco da ilusão de sermos WB, mas depois percebemos que nos falta a paciência, a calma e, acima de tudo, temos a sorte ou o azar de viver num tempo em que, graças à internet, todos estamos sujeitos a um manancial de informação enorme e adquirimos a possibilidade de agir (mal ou bem) em tempo real.

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