12.2.18

Quatro dimensões (parte 1)

O meu amigo Tavares inventou um sistema e agora consegue viajar no tempo.


Há dias na escola deixou-nos a todos varados com as aventuras estupendas que viveu com um dos seus 32 pentavôs que se dava tu cá tu lá com o Camilo Castelo Branco. 

Por jeitos, o avô oitocentista do Tavares era gozado à brava pelo Camilo por ter vindo do Brasil tão carregado de ouro, que lhe deu para inchar ao ponto de ninguém o merecer. Mas nunca deu por ela e como mal sabia ler tomava as graçolas por elogios e nem lhe passou pela cabeça que se tinha tornado modelo de romance. 

O Tavares contou-nos a história meia esfarrapada como se a tivesse sonhado, mas o mais baril foi quando nos explicou como fez de servente de mesa no casamento do vovô com uma das suas trinta e duas pentavós, uma mocinha muito pia e envergonhada quase quarenta anos mais nova. A boda foi um acontecimento de tal monta que até fogo-de-artifício meteu e o avô, que tinha subido ao importante posto de comendador, arregimentou as figuras mais importantes da região e empanturrou toda a gente com carne, morcela, vinhão e acepipes. 

Veio o clero em peso para que tudo fosse feito de maneira regulamentar e também não faltaram capitães da guarda e do exército e condes, viscondes, advogados e juízes. Também alguma ralé para compor. O Camilo era um dos que lá estava a cravar estórias com ar de cusca e, pasme-se, Almeida Garrett. 

Rimo-nos muito quando o Tavares nos contou como, enquanto passava com a bandeja dos rissóis, perguntou ao Almeida o que lhe tinha dado na cabeça para escrever um livro tão aborrecido como o Viagens na minha terra. 

E ele? Ele bebericou um tracinho de pinga muito nervinho em franja como se lhe fosse dar o chilique e chamou o meu avô que tratou de me pôr no olho da rua. 

E eu, ó vô, vô, vozinho sou o seu neto do século XXI e tal e ele nada, correu comigo e por pouco não me acertou o passo. Talvez tenha pensado que eu estava na reinação, coitado do avô, o que é certo é que tive de me pôr a bulir para a máquina do tempo, não fosse ele morrer ali mesmo e eu já não vir a nascer. 

Sim, porque estas coisas das viagens no tempo têm muito que se lhe diga, disso estamos todos perfeitamente conscientes e nem era necessário que o Tavares nos explicasse os riscos tremendos em que incorreu. Tudo somado, é evidente que compensa bastante e eu acho que o meu amigo nem se apercebeu verdadeiramente do enorme tesouro que possui, poder viajar assim, a seu bel-prazer, para a frente e para trás no tempo e verificar in loco tudo aquilo que lemos nos livros ou que vemos nos filmes. 

to be continued...

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