História nº
1 (sexta parte)
O negócio que permitiu ao ourives mudar de vida
começou, se bem se recordam, com a construção de um cofre-forte que caiu no
goto dos vizinhos que começaram a arrendar espaço para guardar os seus valores.
O ourives começou, portanto, por se tornar senhorio.
A atividade de prestamista, o primeiro passo
para se converter num banqueiro, só se pôde iniciar quando o ourives deu conta
de que uma parte do ouro permanecia muito tempo no cofre sem ser levantado
pelos seus donos, e podia ser emprestado a quem dele necessitasse, dando-lhe o
direito a receber juros (com ouro que, no fundo, não possuía). Por isso, a
primeira tarefa do banqueiro foi calcular a probabilidade de uma determinada
quantidade de ouro ser reclamada pelos legítimos donos enquanto decorresse o
prazo de empréstimo a terceiros. Se essa probabilidade fosse, digamos, 50%,
isso significava que o banqueiro só poderia dispor de metade das reservas que
se encontram guardadas no cofre para emprestar e arrecadar os juros, sem correr
o risco de ter de dizer a algum depositante que não possuía o ouro que lhe foi
confiado (o que, evidentemente, seria a desgraça do banco).
Com a introdução do papel-moeda, a quantidade
de ouro que permanecia intocada no banco subiu em flecha, o que deu azo a que o
nosso banqueiro dispusesse de uma percentagem maior para emprestar, aumentando
os proveitos da sua atividade. No limite chegou-se ao ponto em que as reservas
do banco deveriam corresponder a apenas 10% do valor emprestado (atualmente,
são estes rácios de capital que têm vindo, sistematicamente a ter que ser
reforçados).
Para o banqueiro, os problemas começaram quando
as vantagens do negócio atraíram competidores, e obrigaram o banco a distribuir
pelos depositantes parte dos juros que recebia dos devedores, diminuindo o
resultado líquido. No final, o negócio puro da banca acabaria por até nem ser
muito atrativo, porque se tratava de receber juros sobre 90% do capital detido,
contra o pagamento aos depositantes sobre 100% do montante depositado. E mesmo
que houvesse um diferencial significativo entre as taxas cobradas e a taxas
oferecidas, o lucro final nunca seria famoso porque havia todo o conjunto de
despesas de funcionamento e o risco mais ou menos elevado da atividade de
prestamista. Isto, para além do facto já apontado de a riqueza a depositar ser
por natureza finita. Mesmo assim, é evidente que ninguém no seu perfeito juízo
enjeitaria a possibilidade de deter tamanho poder quanto o que estaria ao
dispor dos que dominavam grandes quantidades de capital. Nas mãos certas, a
atividade bancária tinha um potencial que estava muito para além da tarefa de
canalizar o dinheiro de quem o tinha para aqueles que dele precisavam.
E foi neste ponto que o nosso banqueiro
ex-ourives teve a tal ideia epifanense que viria a tornar o negócio dos
banqueiros verdadeiramente fabuloso: criar dinheiro a partir da dívida.
Sem comentários:
Enviar um comentário